Paulo Duarte

O caráter ditatorial da democracia

O caráter ditatorial da democracia

Já muito se escreveu sobre Trump e outros populistas que, de repente, tomam o poder e fazem as capas dos jornais para o bem e para o mal, pelas mais patéticas razões. Mas, o que me preocupa não é a imprensa de fofoca, mas a possível inversão dos padrões clássicos de ética e moral que regem as sociedades ao longo dos tempos.

Dito isto, podemos perguntar-nos se Trump é o responsável. Eu diria que não. Trump é o resultado, na verdade, do grave descontentamento de uma parte do Povo (pelos vistos maioritária), que tem estado aparentemente adormecida, embora em ativo estado de recalcamento face às altas expetativas iniciais em Obama. É assim que eu leio a ascensão de Trump, ditador moderno da maior democracia do mundo. Um ditador que ataca e procura silenciar a imprensa e se alia a outros ditadores internacionais quando se trata de alcançar o poder. Não culpo Hitler, Estaline, Duterte ou Trump totalmente. Não. Eles tiveram e têm carisma. Fizeram e fazem mal, mas o Povo é soberano. Não comparo Trump a Estaline nem a Hitler, pois são ditaduras diferentes em estilo e intensidade. Mas comparo Duterte a Hitler, porque ele próprio fez questão de se comparar ao gabar o seu alegado ‘sucesso’ no combate ao tráfico de estupefacientes nas Filipinas. Hitler estava convicto de que a raça pura necessitava do extermínio em massa de uns quantos judeus e outros impuros. Hitler faleceu antes de concretizar o seu objetivo.

O que sucede é que hoje há vários milhões de judeus vivos. Duterte também vai falecer (estou convicto) sem conseguir erradicar (para não dizer matar, porque é feio) todos os narcotraficantes nas Filipinas. Quanto mais não seja porque a pobreza das Filipinas e de outros países tornam apetecível (o chamado dinheiro fácil) o narcotráfico. Ninguém acaba com a droga eliminando as pessoas que a vendem e distribuem… É isso que Duterte não compreende. Como também ninguém põe fim à imigração clandestina de mexicanos construindo um muro. Hoje há aviões e navios! Os terroristas e os imigrantes ilegais viajam frequentemente em low-cost aéreas. Falsificam passaportes, é certo, mas chegam muitas vezes ao destino.

            O que eu quero dizer com isto é que o que parece evidente para muita gente letrada e culta não o é para outras pessoas. Atenção, não estou a dizer que não haja pessoas cultas a apoiar Trump, mas talvez o façam por outras razões… garantir o seu posto de trabalho ou ascender na carreira… Quantos republicanos que não apoiavam publicamente Trump não estão agora arrependidos, não de forma moral, mas de modo calculista? Se não podes vencê-lo, tenta ser seu amigo. Mas voltando à minha questão, poderá Trump simbolizar um retrocesso civilizacional, uma inversão do paradigma de valores, a (re)escrita da ética? Ainda é cedo e imprudente concluir-se algo sobre outro algo que está em formação. Mas, em caso algum, Trump é o responsável… Ele é produto da escolha da maioria. It’s Democracy, stupid.

Paulo Duarte – Revista Sociedade Militar

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