Geopolítica

LIÇÕES DO CASO TRUMP, a quem interessar possa (I)

LIÇÕES DO CASO TRUMP, a quem interessar possa (I) 

A Revista New York, edição de 2-15 de abril de 2018, publicou uma matéria que traz em sua capa a cômica, para não dizer patética, imagem do Presidente Donald Trump, exibindo, ao invés do nariz, um focinho de porco.  A foto é complementada por pequenas, porém,  significativas  frases que sugerem as palavras-chave que definem uma série de opiniões da imprensa  metropolitana  sobre o Presidente.  

Entretanto, o que chama mais a atenção do leitor é que todas as palavras estão precedidas do advérbio “NÃO”: Not collusion ….   Not  incompetence…  Not  cruelty  (Não conspiração, Não incompetência, Não  crueldade). Todas elas se opõem à afirmativa final: “It is the CORRUPTION, stupid  ( É CORRUPÇÃO, seu tolo). O sentido da mensagem sugere que todo aquele que não entender a correlação entre o Presidente e a corrupção é um tolo.  

O artigo que  complementa a capa é intitulado “The Stench of  It” (O Fedor).  A seguir, a epígrafe:  The extent of the President’s corruption has taken even cynics by surprise. And-more than Russia –it’s his greatest political liability /  A extensão da corrupção  do Presidente pegou até os cínicos de surpresa. E, mais que a Rússia, é sua responsabilidade política.  A matéria é assinada por Jonathan Chait[1].

Esta citação do Presidente abre o artigo: “My whole life I’ve been greedy, greedy, greedy” – “Toda a minha vida eu tenho sido ambicioso, ambicioso, ambicioso” (declaração feita por Donald Trump durante sua campanhia de 2016). Somam-se, aqui, as principais peças do dilema atual pelo qual passam os Estados Unidos da América, centrado na figura do Presidente da República, enquanto, no outro lado do continente norte-americano, encontra-se outra América, que não conseguiu as mesmas benesses do neoliberalismo e padeceu ainda mais do que sua irmã rica do Norte de males sociais contemporâneos que ela própria não combate e que, atualmente, afetam a nação por causa da inaplicabilidade de certos valores que condizem com o exercício do fazer nacional.

Entre eles, estão a relação entre cidadania e moralidade. No Brasil, diferente dos Estados Unidos, o país vem sendo atingido por um contínuo estado de caos causado por seus governantes à coletividade nesses últimos 38 anos e que chegou ao seu ocaso.

Essa condescendência histórica com o mal que nos aflige há séculos é representada por uma só palavra: CORRUPÇÃO. Definida como uma prática nefasta condenada por todos os que a debateram no Ocidente, como Aristóteles, Platão e Maquiavel, até a atualidade, a CORRUPÇÃO é um mal que tem graves consequências político-sociais e econômicas. No contexto atual, tem dois sentidos principais que não podemos perder de vista: a corrução estatal, que consideramos como a forma mais nefasta desse mal à vida nacional, e a corrupção individual.

As duas estão intimamente ligadas e levam o indivíduo a certas práticas que afetam a gravemente a vida social. Definida historicamente como o uso do poder para a obtenção de ganhos pessoais, a corrupção é incompatível com os valores democráticos de uma sociedade, pois se concentra nos interesses de grupos de indivíduos que ignoram o clamor da sociedade e, nesse caso, o compromisso do governo com a sociedade. 

Nos Estados Unidos, a última referência declarada a um escândalo de corrupção entre políticos foi em 1870, por meio da apropriação financeira dos impostos pagos sobre as taxas de bebida e os preços inflacionados na construção das ferrovias Chait (p.23).

Os supostos casos combatidos através do eu são considerados como a maior vitória norte-americana da Era Progressista (1890-1920), como ressalta o jornalista, uma vez que “was establishing rules and norms of professionalism in government so that public officials would not be attempted to sell favors” (foram estabelecidas regras e normas de profissionalismo no governo de tal forma que os funcionários não tentariam vender os favores). Além do estabelecimento dessas regras, o artigo cita fatos interessantes que chegam a ser considerados como medíocres casos de corrupção, como foram os exemplos de Harry Truman, acusado de ter recebido alguns freezers. Também foram acusados de corrupção um dos principais chefes do governo de Eisenhower, depois de receber um casaco de vicuña, e, mais próximo, um dos funcionários da administração de George H.W.Bush, por ter usado o avião militar em benefício próprio e viagens políticas (p.24).

Depois do fato, o funcionário renunciou ao caso. A discrepância política entre os exemplos norte-americanos e os brasileiros sobre um mesmo assunto é tremenda. A diferença entre os dois países incide nos diferentes modelos de sociedade, de controle e, sobretudo, no trato da CORRUPÇÃO. A meu ver, o Brasil é um corpo social em estado metastático, que não pode sucumbir diante desse grande mal ignorado pelo público e ocasionado pela classe política cuja vida de impunidade não se pode mais tolerar. Precisamos banir essa ferida moral de uma vez por todas de nosso país.

É evidente que essa tentativa está sendo realizada por um pequeno grupo de pessoas do Judiciário em contraposição a um imenso número insensível ao problema e, até, como alguns, supostamente relacionados a políticos acusados de corrupção. Porém, esse é um exercício social que depende também de cada cidadão comum em seu papel de vigiar, denunciar e de não ceder à corrupção. Em outras palavras, cada cidadão/cidadã brasileiro/a deve aceitar o desafio e fazer sua parte. Esse momento é de reflexão e, ao mesmo tempo, de ação. Borram-se as fronteiras partidárias. Todos são suspeitos e culpados até que se prove o contrário.

(Próximo artigo: Simulacro e Simulações – Lições do Caso Trump II)    

[1] Comentarista político liberal, editor de The New Republic e diretor assistente de The American Prospect. Seu livro mais recente é How Barack Obama Defied his critics and created a legacy that will prevail (2017)

Ida Maia – Publicado em Revista Sociedade Militar

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