Confronto bélico — loucura ou realidade?
Entre 10 de dezembro e 20 de fevereiro de 2019, Maduro expulsou as delegações diplomáticas do Brasil e dos EUA do território venezuelano, o que não foi cumprido por nenhum dos dois países.
Mais de 50 países no mundo ofereceram ajuda humanitária ao povo venezuelano, por intermédio de Juan Guaidó, presidente interino declarado. Entre eles EUA, que posicionou sua ajuda humanitária na fronteira Venezuela — Colômbia e o Brasil que posicionou sua ajuda na cidade de Boa Vista-RR. Somente Rússia,China e Turquia se declararam neutros ou a favor da legalidade do mandato de Maduro.
Como retaliação, Nicolás Maduro determinou o fechamento físico, com barricadas e militares, tanto da sua fronteira com a Colômbia, tanto com a do Brasil, impedindo a chegada de medicamentos e de alimentos para a população já tão sofrida, isolando o país a oeste e a sul.
Na manhã de hoje, 22 de fevereiro 2019, Nicolás Maduro posicionou defesas navais nas proximidades da ilha de Curaçao nas Antilhas, fechando a fronteira ao norte, posicionou carros de combate e baterias antiaéreas de médio alcance, a cerca de 20 Km da fronteira com o Brasil, na cidade de Santa Helena de Uayren-Vnz, e anunciou que há oficiais das Forças Armadas espalhados por todo o país para garantir a segurança.
Houve relatos de mortes de indígenas e violência contra civis nas fronteiras, e está previsto um show para arrecadar fundos de ajuda humanitária dia 23 fev (amanhã) tanto do lado colombiano, como no lado venezuelano da fronteira entre os dois países, podendo haver mais conflitos entre as forças de segurança de Maduro e sua própria população.
O governo brasileiro convocou uma reunião de emergência para definir estratégias medidas protetivas em relação à diplomacia do País e à garantia da inviolabilidade da integridade do território nacional.
A leitura estratégica dessas medidas é a seguinte:
Maduro cria um ambiente de instabilidade regional ao determinar a saída de diplomatas e posicionar tropas e armamentos estratégicos (carros de combate, mísseis e radares), para se manter no poder ilegitimamente.
Seu poder é garantido pelas Forças Armadas, leais ao regime e sob seu estreito controle, por meio de vantagens financeiras e de delegação de influência a seus generais e oficiais de alta patente, mantendo-os como uma casta superior aos demais venezuelanos.
A tomada medidas diplomáticas pré-guerra, como a expulsão de diplomatas e o fechamento fronteiras, valida uma crise sem precedentes, causada pelo abuso de poder ditatorial de Maduro. Há cerceamento da imprensa livre que tem muita dificuldade de acesso à informação e de locomoção.
Entretanto, a realidade dos fatos não coaduna com as medidas pré-guerra alardeadas na grande mídia. As representações diplomáticas continuam atuando normalmente, o fechamento de fronteiras só agrava a crise humanitária para a população da Venezuela, que há muito carece de suprimentos e remédios, não possuindo efeito prático para a solução da crise.
O fechamento das fronteiras e a aproximação de meios bélicos nas fronteiras norte, oeste e sul são atitudes eminentemente defensivas, ou seja, demonstram um caráter muito mais de proteção da integridade do território do que de preparação para o lançamento de um ataque.
Confirma essa leitura a inexistência de movimentos logísticos de aproximação de tropas e suprimentos substanciais que possam acender uma luz de alerta acerca disso.
Se compararmos as Forças Armadas dos dois países, veremos que o Brasil ocupa a 15ª posição no ranking das potências militares mundiais, enquanto a Venezuela nem aparece. A única ligação terrestre Brasil — Venezuela é a BR 174 e sua continuação, o que dificulta a aproximação sigilosa de meios militares e um ataque ao território brasileiro, por ter que concentrar todas as suas forças de combate em um único eixo, uma vulnerabilidade inaceitável para qualquer estrategista medíocre.
A distância entre o mar e a fronteira do Brasil com a Venezuela impede uma ação bélica apoiada por forças marítimas e os caças estratégicos da Força Aérea Venezuelana não possuem capacidade de reabastecimento em vôo, pistas de desdobramento e nem os aviônicos necessários para lançar mísseis ar-ar ou ar-terra em uma profundidade maior que 300 Km dentro do território brasileiro.
Em número de militares e em capacitação para o combate em região de selva ou de lavrado (vegetação típica da área que liga Pacaraima-RR a Boa Vista-RR), temos que o Exército Brasileiro é três vezes maior e supera o venezuelano em qualidade de treinamento, quando o assunto são operações militares convencionais.
A avaliação do poder relativo de combate entre os dois países resulta em um desequilíbrio positivo para o lado do Brasil, o que afasta ilações quanto a uma possível superioridade venezuelana em uma eventual violação do território nacional brasileiro.
Há pressões diplomáticas de todo o tipo, como a dos EUA, que afirmam que quaisquer ações contra a população, que a prejudique ainda mais, pode ser retaliada com toda as forças (implicitamente a militar) e a do grupo de Lima, cujo protagonista é o Brasil, que exige a retomada das negociações e uma nova eleição, acompanhada por organismos internacionais, para que se possa retomar a normalidade regional.
Entretanto, são apenas pressões. Não houve retaliações econômicas de nenhum dos lados. Os EUA e o Brasil continuam com todos os acordos comerciais vigentes, exceto o do Mercosul, do qual a Venezuela está suspensa desde 2016.
Do outro lado, a Venezuela poderia atingir economicamente o Brasil caso decidisse cortar o fornecimento da energia elétrica comprada, vinda da hidrelétrica de Guri, causando um impacto sério no campo psicossocial, com forte potencial para abalar a infraestrutura de todo aquele estado, dependente mais de 80% da energia venezuelana.
Nessa semana, o Vice Presidente, Hamilton Mourão foi designado para reativar as relações comerciais entre Brasil, Rússia, China e Nigéria, paradas desde 2015, bem como será o principal articulador das relações internacionais de Brasil no grupo de Lima que se reunirá dia 25 de fevereiro para deliberar sobre a crise na Venezuela.
Há muita estratégia na escolha do Vice Presidente (VP) para dirigir os trabalhos de resolução da crise. O General Mourão, antigo adido militar do Brasil na Venezuela, conhece profundamente o pensamento militar venezuelano e seus comandantes; essa escolha coloca o peso da participação direta do segundo mais importante membro do primeiro escalão do Governo Brasileiro, abaixo apenas do próprio Presidente da República (PR), nas negociações e o interlocutor principal para a resolução da crise é o mesmo que negociará com os principais apoiadores do regime de Maduro, Rússia e China, ou seja, o próprio Vice Presidente.
Portanto, avaliando o cenário pelas perspectivas de relações internacionais, da diplomacia militar, da política e da economia, pode-se concluir que a probabilidade de conflito entre os dois países, no momento, é quase inexistente.
Caso Maduro insista em não aceitar ajuda humanitária, impedindo os comboios de entrar no país, pode vir a ser enquadrado nos crimes contra a humanidade previstos no Direito Internacional Humanitário. Isso poderia ocasionar uma intervenção de organismos internacionais como a OEA e a ONU e culminar com sua extradição e consequente julgamento pelo Tribunal Internacional em Haia nos Países Baixos.
Todavia, é mais provável que haja um acordo internacional envolvendo o grupo de Lima, EUA, Rússia, China e Turquia, com Maduro. O resultado provável é que sejam convocadas novas eleições, que seja aceita a ajuda humanitária, que seja concedido asilo a Maduro em algum país da Europa, e que os militares que o mantém no poder sejam isentos de punições e que a Venezuela retome o caminho democrático.
A crise dificilmente levará a um conflito bélico, mas deve-se estar sempre preparado para ele.
Clynson Silva de Oliveira / CEO | Líder Ação Consultoria e Treinamentos.
Artigo publicado em Revista Sociedade Militar
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