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A Dinastia dos homens bons – “Forças Armadas, um dos últimos redutos do preconceito de raça”


“Os sargentos estão para os oficiais como os lavradores para os latifundiários: enquanto os primeiros trabalham e produzem, os segundos apenas se beneficiam dos frutos dos trabalhos dos primeiros.”

General R1 Bolívar Mascarenhas¹

As eleições norte-americanas estão sendo campo de batalha entre as Big Tech (empresas transnacionais de informação e tecnologia) pela atenção, corações e mentes de homens e mulheres americanos. Numa arrojada manobra típica de governos ditatoriais estilo China, Rússia e Alemanha Nazi, Facebook, Twitter e Amazon bloquearam o Presidente e derrubaram o Parler. Tudo isso em questão de dias. Mas por que não devemos rir disso? E por que nós, do Veteranistão, devemos nos acautelar mais do que os outros?

As FA são destinadas à defesa da Pátria, mas não é segredo para ninguém que elas foram estruturadas especialmente para uma única categoria, os oficiais. Os demais militares e suas competências ou destrezas são meios para um fim: pavimentar o caminho ascensional do oficial. Conquanto não seja declarado, tal estado de coisas é axioma básico da caserna. É verdade intocável. Partindo dessa premissa, fica fácil entender a revolta da chibata (e a proscrição da memória do Almirante Negro pela MB), o movimento político dos militares subalternos em 1963 – antessala do golpe militar – (o “ganha, mas não leva” dos sargentos diplomados, mas não empossados), e, ajustando as lentes para o presente, fica mais compreensível ainda a Lei nº 13.954/19 e, tão importante quanto, a vindoura revisão do CPM².

É notável que na formação das FA, a MB tenha passado à História como uma Força que foi “um dos últimos redutos do preconceito ostensivo de raça, e passará como ilha de brancos (…) num país de população predominantemente negra ou mestiça”.³ Nessa “ilha”, cercados por um mar negro, estavam os oficiais. O preconceito é como erva daninha,  cresce rápido, mesmo se cortado. Se não for de raça, será de cor. À proibição legal desses, ele será de classe social. O preconceito não se transmite por genética nem por regulamentações, mas por reinvenção de modelos de dominação. Ele é um meio para um fim. Onde há dominação, houve ou necessariamente há preconceito. A reestruturação da carreira militar em 2019 foi uma reinvenção de um desses modelos. Vendo em perspectiva podemos perceber que a pseudomudança trazida pela Lei não foi mudança, mas aprofundamento e reafirmação do modelo até então vigente. A classe dos “homens bons” (os oficiais, claro!) já há anos infiltrados nos gabinetes parlamentares (as estratégicas assessorias) redigiram a nova ordem, na qual não havia lugar para quem não fosse um deles. Muitos se perguntam por que tamanha indignidade e ingratidão para com a tropa. Um preconceito entranhado por séculos nos componentes de uma instituição acostumada a olhar para trás com assombro e negar histericamente os erros cometidos pode explicar tal comportamento.

Mas as redes sociais não perdoam nada nem ninguém. Hoje, a verdade não é um esporte domingueiro. Toda hipocrisia será desvelada no ato e divulgada de cima dos telhados. Os que conspiraram contra a Família Militar não contavam que os atos e palavras proferidos em 2019 seriam espalhados aos quatro ventos. Por isso, talvez estejam em campo para revisar o CPM. Conhecendo a vilania dos que nos traíram e desprezaram, não seria de espantar que novas regulações viessem a coibir manifestações de militares pelas redes sociais. Estamos hoje mais conectados do que nunca. Há anos, alguns parasitas políticos já consideram controlar a internet, instrumento da liberdade de expressão quase onipotente. O que para alguns deles pode ser uma polícia política, para os oficiais políticos pode vir a ser um safári de caça ao veterano. Uma guerra irrestrita ao Veteranistão pode estar em curso.

Por mais que sejamos corteses e polidos ao nos referirmos às autoridades nas redes sociais, somos um incômodo. Somos uma mancha vermelha no paletó negro que os generais de escritório receberam dos brasileiros e adoram ostentar como se de imaculada brancura fosse. A dinastia dos “homens bons” não aceita que se subverta a sua ordem. Essa ordem é bem conhecida, e do ponto de vista deles, é a ordem societária ideal. Total controle e subserviência, nenhum questionamento que não obedeça a um roteiro pré fabricado. Liberdade de expressão? Só a deles. Direitos humanos? Só “para humana gente”! Se num país, o militar precisa deixar de ser soldado e se tornar político para ser valorizado, essa nação já está nas mãos do inimigo.

JB Reis

¹ PARUCKER, PAULO EDUARDO CASTELLO – Praças em pé de guerra. O movimento político dos subalternos militares no Brasil, 1961-1964, Brasília, 2006

²https://www.sociedademilitar.com.br/2020/08/dinossauro-codigo-penal-militar-nasceu-em-1969-advogados-instituto-de-direito-militar-e-associacoes-querem-participar-de-modernizacao.html

³ SODRÉ, NELSON WERNECK – História militar do Brasil, Rio, 1968. /

Imagem: https://www.wikiwand.com/en/Revolt_of_the_Lash

Os artigos assinados por colaboradores não necessariamente expressam a visão da editoria. Os textos são e continuarão sendo publicados como contribuição ao necessário conhecimento sobre as diversas visões sobre os temas do quotidiano político e militar brasileiro.

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Sociedade Militar