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Tiros, comes e bebes! Ação Popular denuncia adestramentos de tiro, cafés e almoços proporcionados pelo Exército e TAURUS para juízes e desembargadores

Uma ação popular (5003098-66.2021.4.03.6105) que enquadra como réus a fabricante de armas TAURUS, IMBEL e cinco oficiais generais do Exército Brasileiro e tramita na 2ª Vara Federal de Campinas, traz acusações de afronta a princípios como legalidade e economicidade. Segundo a peça, não há previsão legal para que as Forças Armadas promovam eventos comemorativos ou de estreitamento de relações onde funcionários da justiça recebem adestramentos de tiro e participam de coquetéis, cafés da manhã e almoços comemorativos.

Quem a primeira vista vê a participação da Taurus logo imagina que se trata de uma ótima jogada de marketing da empresa com o uso gratuito das instalações das Forças Armadas.

O autor ressalta ainda que o uso de uma grande quantidade de militares que são deslocados para esse tipo de atividade gera um gasto para a administração pública. Segundo o advogado, qualquer funcionário público que não seja militar ou policial, que tenha a opção de usar uma arma para se defender, segundo a lei, tem que custear por meios próprios os próprios adestramentos, exames psicológicos e demais medidas para se adaptar ao uso do armamento.

Nesta senda, confere-se que as condutas perpetradas pela Administração Militar, no que concerne à promoção de eventos para adestramento de tiro para magistrados federais, fere, de forma aguda, o princípio da Legalidade, pois não há nenhum ato normativo autorizativo para que estes eventos ocorram, no âmbito dos Quartéis Generais do Exército Brasileiro, espalhados por todo o território nacional.”

A peça apresenta um número grande de fotografias mostrando membros da justiça recebendo adestramentos de tiro e usando armas de uso privativo das Forças Armadas.

… percebeu-se a promoção dos referidos eventos nos cantos mais remotos do país, com o uso de armamentos não apenas da fabricante Taurus Armas S.A, mas também de armas brasonadas, de uso privativo do Exército, como BERETTA 9 mm, Pistola 9mm GC MD1, Fuzil de ar comprimido, etc. Além disso, houve uso de viaturas militares, com grande número de militares envolvidos em atividades de apoio e instrução aos magistrados, onde foram montados verdadeiros espetáculos circenses, com direito, inclusive, a exposição de veículos antigos. Constatou-se, ainda, o fornecimento de almoços comemorativos, durante esses eventos, com a finalidade de estreitar os laços com o Judiciário, custeados com recursos da União Federal.”

Atos lesivos não apontados

Tanto o juiz como o o Ministério Público se manifestaram sobre a não discriminação dos atos lesivos à nação causados pelos eventos promovidos nas instalações militares.

“…  incabível este instrumento constitucional para questionar ato sem prova inequívoca da lesividade concreta do ato, o caso é de ausência de interesse de agir por inadequação da via eleita, o que exige a extinção do feito sem julgamento do mérito. Ante o exposto, o Ministério Público Federal se manifesta pela extinção do feito sem a resolução do mérito, em virtude da inadequação da via eleita, nos termos do artigo 485, inciso VI do Código de Processo Civil.”… Ministério Público.

Abaixo a sentença em primeiro grau, onde o magistrado extingue a ação com base na premissa de que o autor não teria sido capaz de apontar de fato quais foram os prejuízos ao erário público.

O juiz diz ainda que como os magistrados têm direito ao porte de arma e é exigido dos mesmos comprovação de capacidade técnica para o porte de arma de fogo, por esse motivo “devem se submeter a treinamentos periódicos de tiro e exame de capacidade técnica; e podem se valer, para essa capacitação, de serviços prestados por órgãos da União, sem ônus”.

“ Trata-se de Ação Popular … Descreve como atos lesivos ao patrimônio público treinamentos de tiro realizados para Magistrados em diversas dependências das Forças Armadas. Questiona a origem dos recursos que teriam custeados essas atividades. Requer que “julgue os presentes pedidos inteiramente procedentes e condene a Impetrada no pagamento de custas e honorários advocatícios (art. 12, Lei nº 4.717/65), bem como ao ressarcimento das perdas e danos … Traçando um paralelo entre a situação posta nos autos pelo autor e aquela objeto do julgamento proferido pelo STF, correto concluir que os treinamentos aos Magistrados, disponibilizados por agentes das Forças Armadas, não configuraram qualquer ilegalidade. Assim, ausentes elementos mínimos quantos aos supostos atos lesivos e danos causados ao patrimônio público, é o caso de reconhecimento da carência da ação. Diante do exposto, reconheço a carência da ação, extinguindo o feito sem resolução do mérito, com fulcro no art. 19, da Lei nº 4.717/65, cc art. 485, inciso VI, do CPC. “

Todavia, a coisa não acabou. Foi oferecido recurso. Na réplica o advogado faz declarações contundentes e que de fato devem fazer com que o processo percorra todas as instâncias possíveis e logo de cara aponta que em decisões de cortes superiores foi dispensado que se aponte o ato lesivo em condições análogas à ação proposta.

“quanto ao assunto é imprescindível a menção à edição pelo Supremo Tribunal Federal do Tema 836 da sua jurisprudência afirmando: ‘Não é condição para o cabimento da ação popular a demonstração de prejuízo material aos cofres públicos, dado que o art. 5º, inciso LXXIII, da Constituição Federal estabelece que qualquer…”

Tudo quanto foi exposto encontra-se absolutamente demonstrado por meio de matérias jornalísticas e fotografias

 “Excelências, não há o que se falar em ausência de evidências da ilegalidade dos atos praticados e dos danos deles decorrentes, haja vista tudo quanto foi exposto encontra-se absolutamente demonstrado por meio de matérias jornalísticas e fotografias reais dos eventos supracitados…, diz o advogado em sua réplica.

E continua:

… É impossível que diante de um evento que exige a mobilização de inúmeros militares do Exército Brasileiro para atuarem como instrutores de tiro de membros do Judiciário, a promoção de almoços comemorativos e a disposição de inúmeras viaturas da Polícia do Exército não tenham ocasionado nenhum dano ao Erário…

… é possível perceber o uso de viaturas militares, com grande número de militares envolvidos em atividades de apoio e instrução de tiro aos magistrados, onde foram montados verdadeiros espetáculos, com direito, inclusive, a exposição de veículos antigos. Para somar, constatou-se, ainda, o fornecimento de almoços comemorativos, durante a realização dos eventos, com a finalidade de “estreitar os laços” entre a organização do Exército Brasileiro e o Judiciário, sendo absolutamente tudo custeado, ao que tudo indica, com os fartos recursos da União Federal e, diga-se de passagem, o Erário. Excelências, é muito importante colocar em evidência que os fatos supranarrados não estão sendo maquiados ou tampouco maximizados.

Por fim o advogado questiona o que faria com que MAGISTRADOS entendessem que podem ter instrução de tiro ministrada por militares do Exército na medida em que o uso do armamento é uma decisão pessoal

“Ora, data maxima venia, o que coloca os doutos magistrados em sobreposição aos demais membros do Poder Judiciário, mesmo que habilitados ao porte de arma, a acharem que podem ter instrução de tiro por membros do Exército Brasileiro? Tal regalia seria extensível aos demais servidores do judiciário? Além disto, é evidente que o precedente invocado…  diz respeito expressamente à “Polícia Federal”, e não ao Exército Brasileiro. É cediço que a competência constitucional dos membros das Forças Armadas é diametralmente distinta da competência constitucional dos membros da Polícia Federal.”

Uma guerra inglória! O advogado questiona se a justiça de fato facilmente puniria condutas praticadas pelos próprios magistrados

“… Agora, pelo exposto, não é necessário se dizer que estamos diante de uma verdadeira “guerra inglória”. Afinal de contas, como se pode esperar que o douto magistrado do Juízo a quo queira condenar condutas praticadas pela sua própria classe? De fato, talvez isto seja pedir demais…

…  justamente por esta razão que se recorre a este Egrégio Tribunal, na esperança de que se dê prosseguimento à Ação Popular, outrora ajuizada, e, enfim, se apure eventuais danos patrimoniais acarretados aos cofres públicos, quando da promoção destes eventos. ”

Robson Augusto – Revista Sociedade Militar

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Sociedade Militar