Forças Armadas

Bolsonaro, a ruptura em um sistema completamente montado

BEM VINDOS A DITADURA – Texto de colaborador

Você sabe o que é uma ditadura? Com certeza tem uma ideia de acordo com as notícias que vê e de informações que lhe chegam por diversos caminhos. Alguns políticos adoram chamar a tudo de ditadura, de fascismo, ou qualquer conceito que não saiba a sua real definição e o utiliza como xingamento ou adjetivo.

Uma ditadura basicamente ocorre quando as leis são DITADAS por um governo autoritário, independente de sua formação política ou ideológica. Não há participação do povo nas escolhas. A Constituição não é respeitada ou é elaborada uma Constituição de acordo com os objetivos do governo autoritário, que pode alterá-la ao seu bel prazer. É claro que o assunto é imensamente mais complexo do que isso.

Fato é que uma ditadura raramente chega de repente e com o objetivo claro. Para que ela seja instalada é necessário apoio popular e das Forças Armadas. Para isso, é preciso a propaganda, e a imprensa pode ser utilizada como ferramenta. Desarmar a população é outra estratégia para facilitar a tomada do poder, que muitas vezes é cedido em primeiro momento.

A ditadura nunca vai se proclamar como tal, e sempre que possível vai utilizar o termo democrático e republicano a seu favor, enquanto vai acusar os opositores de fascistas ou infiéis, no caso das teocracias.

Mas esqueçam da imagem de tomada de poder por guerrilheiros ou com o exército com jipes e tanques. Ou uma revolução com o povo nas ruas também empunhando fuzis. Isso já era contestado até nos anos 30, com intelectuais planejando outras formas de tomar o poder.

Parece que no Brasil desenvolveu uma outra forma de ditadura: a do judiciário, ou esse poder foi descoberto como a maior ferramenta para implantar uma ditadura moderna em um país, isso apenas o futuro dirá. Mais do que em outras ditaduras, o conceito democrático é utilizado, agora na forma de um poder constituído legalmente.

A questão é complexa, une tanto a corrupção quanto a ideologia. O sistema se montou por décadas, iniciamos a redemocratização com uma aversão a direita, associada ao governo militar, contudo o primeiro governo a assumir tinha uma característica mais centrista. Em seguida veio Collor, uma bagunça ideológica e corrupta. Fernando Henrique Cardoso deu início a esquerda propriamente no poder, a social democracia, ou como muitos acusam, a Esquerda Fabiana. Reorganizou a economia e trabalhou bem sua imagem.

Com a chegada de Lula ao poder, tivemos quase quatro mandatos fortemente ideológicos, principalmente na questão cultural. As instituições foram aparelhadas, principalmente o STF, chegando a ter 8 Ministros, de um total de 11, indicados pelo PT. Temos também o STJ, as universidades, grande financiamento para artistas de renome, emissoras de TV, rádios, blogs, sites, revistas, megaempresários, etc.

Com a chegada de Bolsonaro houve uma ruptura em um sistema completamente montado, o teatro das tesouras foi desfeito.

Os financiamentos da mídia e de artistas foram drasticamente reduzidos o que fez com que esses se tronassem inimigos ferrenhos do governo, tornando-se mais uma ferramenta para um instrumento de uma ditadura.

Como eu disse, as coisas acontecem aos poucos, é como cozinhar sapo com água morna. Os direitos vão sendo tomados à medida do necessário e só o que realmente importa, o que não atinge a todos, só alguns pontos estratégicos capazes de formar opinião. O restante apenas observa, mas como não são capazes de atrapalhar, são inicialmente tolerados.

O sistema montado no Brasil tornou possível a ditadura da toga, liderada pelo STF. Começa pela forma que os ministros foram escolhidos. Temos apenas um juiz, a maioria é composta por advogados. Todos, com exceção aos dois últimos indicados por Bolsonaro, são alinhados ideologicamente, mas isso não é ilegal nem imoral.

O que salta aos olhos são as ligações intimas dos ministros. Toffoli foi advogado do PT, Fachin foi militante do MST e trabalhou diretamente na eleição de Dilma, entre outros exemplos que os impediria de tomarem decisões referentes a seus padrinhos, mas nunca se declaram suspeitos ou impedidos.

O sistema de pesos e contrapesos seria o Senado, contudo, grande parte dos senadores responde a processos no STF e temem ser alvo de vingança.

Os grupos atingidos têm um inimigo em comum, o atual governo, o conservadorismo, a direita. É o mesmo inimigo das grandes emissoras, de mais de 90% dos jornalistas, dos artistas que perderam financiamento e dos partidos de oposição. Dessa forma, há uma falsa sensação de controle da opinião pública que se cala aos seus atos de autoritarismo.

O autoritarismo vai aumentando à medida que sente resistência. Nesse momento o medo é a reeleição de Bolsonaro, pois o primeiro turno mostrou que ele terá maioria no senado e na câmara dos deputados, dando maior poder, o que significa retirar o poder de seus opositores, então vão para o tudo ou nada.

A audácia de nossos autoritários na verdade só ocorre por alguns motivos que o sistema deixou evidente. O autoritário se sente seguro para faze o que quer, no caso, ele vê o Senado com as mãos atadas e a grande mídia calada e até contente com suas ações.

O autoritário sabe que na verdade o país se esforça por manter a democracia, pois as ações dele são maquiadas como democrática e a mídia o protege, de forma que impedi-lo vai gerar a acusação contrária, de que ele é a vítima.

O autoritário não tem o poder da espada, mas sabe que as Forças Armadas não querem se intrometer nessas questões, pois a experiência mostrou que com o passar do tempo, guerrilheiros e assaltantes chegaram ao poder, e a mesma mídia que hoje aplaude o autoritarismo de parte do judiciário, foi a que denegriu por décadas a imagem das Forças Armadas e das polícias, enquanto os políticos minaram as instituições dificultando verbas e modernização.

Em última instância, o autoritário sabe que na pior das hipóteses, nossa história mostrou que em uma revolta o Brasil não foi violento como ocorreu em outros países, então caberá um exílio na França, financiado talvez por empresários ocultos ou até mesmo nações amigas.

Dessa forma então, ficam a vontade para perseguir e censurar jornalistas, emissora de TV, de Rádio, mandar prender empresários em grupos de Whatsapp, e até algo que poucos ditadores fizeram: cesura prévia. Foi o que fizeram ao proibir a vinculação de um documentário do Brasil Paralelo, antes mesmo de ser exibido.

E o cidadão comum? O que mantem a estabilidade de um país é sua economia. Se a economia vai bem, a verdade é que a maioria deixa a liberdade para segundo plano, e se não incomodarem, não serão incomodados.

Contudo, o autoritarismo sempre provou que leva o país a ruina, pois é a liberdade que aponta falhas e corrupção, e final é sempre a desgraça econômica e a violência.

“O preço da liberdade é a eterna vigilância”.

Davidson Abreu é analista de Segurança Pública com mais de 28 anos de experiência. / Bacharel em Ciências Sociais e Jurídicas / Professor, Escritor e palestrante / Autor do livro Tolerância Zero e outros.

A Revista Sociedade Militar não necessariamente concorda com textos assinados por colaboradores, a publicação integral é parte de nossa política de discussão livre sobre assuntos relacionados às Forças Armadas, geopolítica e instituições de segurança brasileiras.

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