Uma nota da rede CNN BRASIL sobre um novo “manifesto interclubes” chama a atenção de militares de todos os postos e graduações quando diz: “MILITARES DA RESERVA EMITEM NOTA DEFENDENDO VOTO AUDITÁVEL”.
Sem questionar as razões ou o conteúdo da nota, intitulada URNAS ELETRÔNICAS COM VOTO IMPRESSO AUDITÁVEL, a pergunta que nos surge – instigada por mensagens de Whatsapp recebidas de vários leitores – diz respeito à autoria e sobre quem de fato endossa o documento.
Se os clubes militares possuem em seus quadros militares da ATIVA e RESERVA as notas publicadas falam à sociedade em nome de quem, afinal?
Associados da ativa e reserva
Formado não só por militares da reserva, mas também por oficiais da ativa, o Clube Militar do Rio de Janeiro tem emitido, uma após outra, notas em apoio ao presidente Jair Bolsonaro. A instituição não só emite notas e manifestos, mas saindo do campo virtual convida os sócios para manifestações em apoio a políticos que julga estarem do lado certo.
O próprio Exército incentiva os jovens oficiais a se associar ao clube, a ponto de publicar chamadas da instituição na própria página institucional da força. Com isso, sabe-se que parcela significativa dos associados é formada por oficiais da ativa.
A opinião publicada é dos associados ou expressa simplesmente o que pensam os diretores da instituição?
Se a opinião manifesta é a dos associados, a coisa fica bem complicada pois ao militar da ativa é proibido a manifestação política individual ou coletiva.
Diz o Regulamento Disciplinar do Exército que assim como é proibido participar de manifestações políticas também é proibido autorizar a publicação de representações ou documentos coletivos de cunho político.
É contravenção disciplinar: 105. Autorizar, promover, assinar representações, documentos coletivos ou publicações de qualquer tipo, com finalidade política, de reivindicação coletiva ou de crítica a autoridades constituídas ou às suas atividades …
Ontem surgiu na grande rede um manifesto assinado pelos três clubes militares, percebe-se que somaram-se à empreitada política do Clube Militar os seus congêneres da Marinha e da Aeronáutica.
O manifesto interclubes e o recuo diante da ira de Dilma Roussef
Fato semelhante ao manifesto publicado essa semana ocorreu no passado recente. Uma nota batizada de manifesto Interclubes foi emitida no início de 2012 contra Dilma Rousseff, mas diante do primeiro grito da então presidente da república as três instituições retiraram na correria os documentos de seus sites e chegou-se ao cúmulo de dizer que foi parar lá por engano.
As críticas da própria oficialidade na época variaram muito, alguns falaram que generais presidentes dos clubes estavam aterrorizados ante a grita de Dilma e outros – mais pragmáticos – conjecturaram que as instituições estariam com medo de perder diante das Forças Armadas sua permissão de descontar as mensalidades direto nos pagamentos dos associados, o que deixaria os clubes em maus lençóis.
Têm ainda surgido críticas na imprensa sobre a verdadeira função dos clubes, que deveria ser unicamente recreativa / cultural, na medida em que militares não podem se sindicalizar.
Chama a atenção trecho do estatuto do Clube dos Oficiais da Aeronáutica, que diz que a instituição defenderá direitos da oficialidade.
“Art. 6º – O Clube de Aeronáutica tem por objetivos: … II – defender os interesses coletivos dos associados e pugnar por medidas acauteladoras dos seus direitos; III – defender os interesses coletivos dos associados Oficiais da Aeronáutica, em particular, e dos seus associados militares, em geral;”
O Estatuto do Clube Naval diz que a instituição não pode participar de manifestações de caráter político-partidário.
Art. 9º – É vedado ao Clube Naval: I – associar-se a manifestações de caráter político-partidário …
Abaixo a nova nota conjunta dos clubes recreativos dos oficiais das Forças Armadas publicada nessa segunda-feira, 2 de agosto de 2021.
URNAS ELETRÔNICAS COM VOTO IMPRESSO AUDITÁVEL
Rio de Janeiro, 02 de Agosto de 2021
A confiabilidade e a transparência de um processo eleitoral constituem requisitos básicos para uma democracia saudável, e suscitaram o debate sobre a implementação da urna eletrônica com voto impresso auditável, em análise pelo Congresso Nacional, provocado pela PEC 135/2019.
As Urnas Eletrônicas (DRE – Direct Recording Electronic Voting Machines) de 1ª Geração foram implantadas em 1996. De 2006 a 2012, Holanda, Alemanha, EUA, Canadá, Rússia, Bélgica, Argentina, México e Paraguai abandonaram-nas. Em 2014, India e Equador adotaram modelos mais avançados. Embora já exista a Urna E de 3ª Geração, o Brasil insiste em utilizar as superadas Urnas E de 1ª Geração.
A auditagem das urnas não pode ser enxergada a olho nu. Trata-se, de uma inescrutável caixa preta. A inviolabilidade das urnas eletrônicas, atestada pela própria equipe técnica do TSE, não pode ser um dogma. O TSE bloqueia sistematicamente propostas de teste do sistema solicitados por equipes externas, o que pode levar à suspeita de que tem algo a esconder. Por que essa exclusiva “segurança em obscuridade”? Por que tal segregação, se todos, indistintamente, tem direito à verdade?
No entendimento do TSE, apoiado na letra jurídica, o ônus da prova cabe a quem reclama de fraude. Mas pelo fato de todo o processo ser digitalizado, sem a existência de provas visíveis e tangíveis, torna-se impossível atestar uma possível ilicitude. Se não há como apresentar provas materiais, a questão permanece em suspenso, o que favorece os tenazes defensores do sistema. Até quando vai perdurar esse circunlóquio?
Pessoas dotadas de nível mediano de conhecimentos sobre sistemas sabem que celulares e computadores são vulneráveis a vírus e invasões. No tocante a Urnas E, o universo de pragas cibernéticas pode compreender, dentre outros malefícios, a clonagem e adulteração de programas, a inclusão de programas maliciosos para desvio de votos de um candidato para outro, a supressão de votos, fraudes na apuração e totalização de votos e pré-inserção de votos nas urnas.
Sistemas digitais da NASA, do Pentágono, de partidos políticos americanos e de grandes empresas privadas, mesmo protegidos por sistemas de segurança (CyberSecurity) up to date, já foram invadidos. Hackers, por ideologia e/ou interesses financeiros, são gênios do mal e estão sempre um passo à frente em termos de avanço tecnológico. Diante destas inquestionáveis evidências, seriam as urnas eletrônicas brasileiras realmente inexpugnáveis?
De acordo com o previsto na PEC 135/2019, mediante a impressão, o eleitor não tocaria o voto, tampouco o levaria consigo, apenas o veria, verificaria se ele de fato corresponde ao candidato que aparece na tela, confirmaria, o papel cairia e permaneceria armazenado dentro de urna lacrada, o que possibilitaria, caso necessário, futuro cotejo e recontagem. Portanto, nada mais falso afirmar que, com a impressão do voto, o eleitor poderia ser pressionado por “benfeitores”, traficantes, milicianos e afins. Pura desinformação.
O TSE, administrador-mor do sistema, prega a dependência absoluta do software, ao afirmar que um aumento da interferência humana ocasionaria erros que abririam brechas para a judicialização do processo eleitoral. Obviamente, nenhum sistema está totalmente a salvo da maldade dos homens. Mas seria a aceitação passiva dos resultados da urna eletrônica mais aconselhável, a fim de evitar questionamentos válidos, no melhor estilo “Cale-se, eu sei o que é melhor para você”? Eis a verdadeira ditadura.
O sistema de urnas eletrônicas com voto impresso auditável, indubitavelmente, acrescenta equipamentos eletrônicos, o que aumenta a probabilidade da ocorrência de problemas sistêmicos, além de gerar necessidades logísticas e de segurança física. Caberia ao TSE ser proativo e estabelecer planos contingentes para que o sistema como um todo possa operar de maneira eficiente. A justificativa de que, em face da pandemia, o gasto de três bilhões de reais com o custo da implementação das urnas eletrônicas com voto impresso auditável seria inadmissível não se sustenta, pois a lisura e a transparência do processo eleitoral – essenciais para uma salutar democracia – não tem preço, seja em que tempo for.
O prazo final para a resolução desse imbróglio, visando as eleições de 2022, será outubro. Esperamos que não seja um outubro vermelho, mas sim verde e amarelo, pelo bem do Brasil.
AE Luiz Fernando Palmer Fonseca / Presidente do Clube Naval
GenDiv Eduardo José Barbosa / Presidente do Clube Militar
Maj Brig-Ar Marco Antonio Carballo Perez / Presidente do Clube de Aeronáutica
Texto de Robson Augusto /