A Embraer vive um momento paradoxal: enquanto conquista espaço inédito no mercado internacional de defesa, especialmente na Europa, enfrenta turbulências domésticas que ameaçam seu desempenho e reputação. A recente aprovação de uma greve por parte dos metalúrgicos da unidade de São José dos Campos ocorre justamente quando a empresa se prepara para entregar, ainda em 2025, o primeiro caça leve A-29N Super Tucano à OTAN — marco histórico para a indústria aeroespacial brasileira.
Super Tucano para Portugal: marco estratégico
Portugal será o primeiro país da OTAN a operar a versão navalizada do A-29N Super Tucano, um caça leve desenvolvido pela Embraer com capacidade de atuação em missões navais e de patrulha marítima. O contrato firmado entre o governo português e a empresa brasileira inclui 12 aeronaves, além de apoio logístico completo, simuladores de voo, treinamento de pilotos e manutenção técnica.
O modelo adquirido foi modificado para atender aos protocolos da Aliança Atlântica, com sistemas de comunicação integrados, sensores de última geração e capacidade de uso de armamentos guiados, como mísseis e torpedos. A venda fortalece a presença da Embraer no mercado europeu — tradicionalmente dominado por fabricantes dos Estados Unidos, Reino Unido e França — e reforça a confiança em um produto testado com sucesso em cenários reais de combate na Colômbia, Nigéria e Afeganistão.
Greve no Brasil: um sinal de alerta
Apesar do sucesso externo, a realidade interna da Embraer revela tensões que colocam em risco sua estabilidade produtiva. Em abril de 2025, os trabalhadores da planta central da empresa, localizada em São José dos Campos (SP), aprovaram uma greve geral. O principal motivo: reivindicações salariais diante do aumento do custo de vida e defasagem nos reajustes.
A paralisação ocorre em um momento estratégico, às vésperas da entrega de aeronaves para Portugal e outros compromissos com clientes internacionais. Especialistas do setor apontam que a greve pode prejudicar não apenas cronogramas logísticos, mas também a imagem da Embraer como fornecedora confiável no cenário global. A situação levanta questionamentos sobre a governança trabalhista na indústria nacional de defesa e a capacidade do Brasil em garantir segurança jurídica e estabilidade produtiva.
Pressões externas e riscos de desestabilização
Desde a ruptura do acordo com a Boeing, que previa a venda parcial da divisão de aviação comercial da Embraer, a empresa tem adotado uma postura mais autônoma e agressiva no mercado internacional. Seus produtos, como o cargueiro KC-390 e o próprio Super Tucano, têm se destacado por aliar alto desempenho técnico a custos mais acessíveis, atraindo interesse de forças aéreas da Europa, Ásia e América Latina.
Esse avanço, no entanto, incomoda concorrentes internacionais. Há relatos de pressões externas e tentativas veladas de enfraquecimento da companhia, como forma de preservar o domínio das tradicionais potências do setor. Em paralelo, observadores também destacam o papel de setores internos que, por motivações políticas ou ideológicas, atuam contra o fortalecimento da Embraer, inclusive por meio de movimentos sindicais conflituosos.
Um ativo nacional estratégico
A Embraer não é apenas uma fabricante de aviões: é um símbolo de soberania tecnológica, capacidade industrial e inserção global do Brasil. Sua trajetória nas últimas décadas consolidou a empresa como uma das maiores fabricantes de aeronaves do mundo e referência no segmento de defesa, aviação regional e soluções integradas.
O momento atual exige responsabilidade por parte de todos os atores envolvidos — trabalhadores, governo e sociedade civil. Sabotar a Embraer, intencionalmente ou não, é enfraquecer um dos poucos setores em que o Brasil disputa de igual para igual com as maiores potências globais.