Recentemente, a diplomacia brasileira engajou em uma abordagem no mínimo curiosa. Simultaneamente, o Planato e a Marinha encontraram-se – e até fizeram acordos – com potências globais de diferentes esferas geopolíticas.
Dois eventos recentes ilustram essa estratégia incomum: de um lado, uma negociação com a Rússia, envolvendo inclusive a disponibilização de um avião da Força Aérea Brasileira para um chanceler russo. De outro lado, a colaboração em defesa com o Reino Unido, simbolizada pela assinatura de um acordo entre os Ministros das Relações Exteriores do Reino Unido e do Brasil, David Cameron e Mauro Vieira.
Essas negociações refletem uma dinâmica confusa, além de ilustrar a complexidade das relações exteriores do Brasil.
Afinal, o que o Brasil quer?
O Aceno à Rússia
A decisão do governo Lula de facilitar a viagem de um chanceler russo, utilizando um avião da Força Aérea Brasileira, reflete uma tentativa de manter uma relação diplomática equilibrada com a Rússia. No entanto, o que pouco se fala, é que a viagem usando o avião brasileiro visava sobretudo driblar sanções impostas por potências ocidentais.
De acordo com informações, a empresa encarregada do abastecimento em Brasília não pôde fornecer combustível ao avião russo devido às sanções. O Brasil, contudo, decidiu assim mesmo oferecer uma aeronave da Força Aérea Brasileira (FAB) para garantir a chegada segura do ministro Lavrov à capital.
Uma Jogada Questionável?
Ao facilitar a viagem do chanceler russo, desafiando assim as sanções impostas pelos Estados Unidos, o Brasil num primeiro olhar parece buscar uma postura de independência no cenário internacional. No entanto, essa decisão foi duramente criticada por sua potencial falta de alinhamento com os princípios de direitos humanos e ordem global baseada em regras internacionais, considerando o contexto das sanções.
A tentativa de manter laços amistosos com a Rússia, portanto, poderia ser vista como uma diplomacia confusa, que arrisca o posicionamento do Brasil como um defensor dos valores democráticos e da legalidade internacional.
Cooperação com o Reino Unido: Diversificação ou Incoerência?
Por outro lado, a assinatura de um acordo de cooperação em defesa da Marinha do Brasil com o Reino Unido reflete um esforço para se alinhar com parceiros tradicionais do Ocidente. Essa ação é louvável pela busca de avanços tecnológicos e fortalecimento das capacidades de defesa nacional. No entanto, quando colocada em contexto com a aproximação simultânea à Rússia, suscita dúvidas sobre a consistência da política externa brasileira.
Essa ambiguidade pode levar à percepção de uma diplomacia sem uma direção clara, potencialmente prejudicando a imagem internacional do Brasil e sua capacidade de agir como um mediador confiável em questões globais.
A Necessidade de Clareza e Consistência
Essa falta de uma narrativa coesa e princípios claramente definidos pode ser vista sobretudo como uma fraqueza, senão, como falta de alinhamento entre os poderes. Forças Armadas e Planato estariam, portanto, completamente desalinhados nesse sentido.
Críticos podem argumentar que uma política externa eficaz não se mede apenas pela capacidade de manter múltiplos diálogos, mas pela habilidade de fazê-lo de maneira que promova sobretudo os interesses nacionais de forma coerente. Para fortalecer sua posição no cenário global, o Brasil poderia beneficiar-se de uma abordagem mais integrada e transparente.
Não há, no entanto, indícios que reconciliem as ambições brasileiras de autonomia com o compromisso com a ordem internacional atual.
Rafael CVC .. Revista Sociedade Militar