O Ministério da Defesa, guiado pelas avaliações dos estados maiores do Exército, Marinha e Aeronáutica, forneceu um panorama detalhado da situação militar na Venezuela em uma nota oficial à Câmara dos Deputados. O documento, extenso, assinado pelo Vice-Almirante André Luiz de Andrade Felix, enfatiza a percepção de baixa disponibilidade de equipamentos e capacidade logística limitada das Forças Armadas e da Guarda Nacional Bolivariana da Venezuela, concluindo que elas não representam uma ameaça direta à integridade do território brasileiro e que são capazes apenas de assegurar a permanência do regime de Nicolás Maduro.
Apesar da tranquilidade na fronteira, o texto deixa claro que o Brasil mantém um olhar vigilante. As forças militares brasileiras e serviços de inteligência, segundo os documentos obtidos pela Revista Sociedade Militar, não identificaram movimentações anormais de tropas venezuelanas, mas ainda assim há um processo de fortalecimento das guarnições fronteiriças do Exército Brasileiro, particularmente em Roraima. Segundo a nota explicativa, a ideia é transformar a atual guarnição da região em um Regimento de Cavalaria Mecanizada, refletindo a importância estratégica e os desafios únicos da área.
O Requerimento de Informação nº 2993/2023, enviado pela Câmara dos Deputados, expressou preocupações sobre a capacidade do Brasil de defender seu território, questionando o Ministério da Defesa sobre estratégias para garantir a inviolabilidade nacional.
O Ministério destacou que há desafios econômicos que limitam as possibilidades logísticas da Venezuela, diz que há níveis de níveis de treinamento com restrição e que o equipamento militar venezuelano, em grande parte proveniente da China e Rússia, é relativamente moderno. Entretanto, a indústria de defesa venezuelana é incipiente em comparação com o Brasil, dominada por pequenas empresas estatais que se dedicam a produção de armamentos leves e munições.
A capacidade naval do país também seria limitada a construção de pequenas embarcações de patrulha costeira.
Os parlamentares brasileiros também indagaram sobre a quantidade de caças SU-30, F16 e as plataformas S300, recebendo a confirmação de que a Venezuela possui 15 F-16A/B, 21 Su-30MKV e 2 sistemas de mísseis S-300VM.
Robson Augusto – Revista Sociedade Militar
MINISTÉRIO DA DEFESA
ESTADO-MAIOR CONJUNTO DAS FORÇAS ARMADASDespacho no 42/EMCFA-MD Processo no 60011.000308/2023-52
Ao Senhor Chefe da Assessoria Especial de Relações Institucionais (AERI)Assunto: Requerimento de Informação nº 2993/2023.
Em atenção ao Despacho nº 683/AERI/GM-MD, de 19 de dezembro de 2023 (6787666), encaminho a resposta deste Estado-Maior Conjunto, para apreciação e ações decorrentes:
1. Qual a avaliação estratégica faz o Ministério sobre a movimentação da Venezuela?
O contencioso entre a Venezuela e a Guiana, referente a região de Essequibo, caminha para uma solução pacífica, por meio dos canais diplomáticos, privilegiando a paz e o diálogo na solução de conflitos, como rege a tradição diplomática brasileira de solução de controvérsias.
A reunião entre os presidentes da Venezuela, Nicolás Maduro, e da Guiana, Irfaan Ali, no dia 14 de dezembro, na ilha caribenha de São Vicente e Granadinas, levou à assinatura da DECLARAÇÃO CONJUNTA DE ARGYLE PELO DIÁLOGO E PAZ ENTRE GUIANA E VENEZUELA (tradução nossa), na qual os dois países se comprometem a não usar a força – direta ou indiretamente – em nenhuma circunstância. O documento deixa claro que a controvérsia sobre a atual fronteira entre os dois países não poderá ser motivo para agressões mútuas.
Guiana e Venezuela se comprometem, ainda, que irão se abster de intensificar – por palavras ou ações – qualquer conflito ou desacordo entre elas e que qualquer incidente eventual entre os dois Estados será imediatamente levado à Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos (Celac), à Comunidade Caribenha (Caricom) e ao presidente do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, para que seja contido e revertido e que tenha sua recorrência prevenida.
1.1. Os serviços de Inteligência militares estão atentos e avaliando a evolução dos acontecimentos?
No contexto da questão de Essequibo, a atividade de Inteligência de Defesa se empenha na captura da realidade e a constante identificação das ameaças, a fim de produzir conhecimentos que possam orientar o emprego do Poder Militar e garantir a consciência situacional nos níveis estratégico, operacional e tático.
A manutenção da integridade do território e a defesa do patrimônio da Amazônia brasileira e das Águas Jurisdicionais Brasileiras (AJB) são prioritários para a Inteligência de Defesa, na produção e difusão de conhecimentos que orientem a mobilidade e a presença das Forças Armadas nessas áreas, conforme se observa nas recentes mobilizações de tropas e meios do Exército Brasileiro para o Estado de Roraima.
1.2. Estão empregando toda sua capacidade na avaliação das ameaças ao Território Nacional?
Sim. Estão sendo empregadas diversas fontes de informações.
2. Sobre o possível “Teatro de Operações Essequibo”: como a pasta avalia as possibilidades de progressão das forças venezuelanas, caso concretizem suas ameaças de incorporar o aludido território?
Não foram observadas movimentações anormais de tropas de ambos países nas proximidades das nossas fronteiras.
3. Considerando que as áreas fronteiriças constituem terrenos inadequados para a progressão rápida de Forças Blindadas e Mecanizadas, para atingir seus objetivos, a Venezuela poderia realizar um Desembarque Anfíbio ou uma Operação Aerotransportada para ocupar. Ainda assim, tais movimentos ensejam o envio de Forças Blindadas e Mecanizadas para realizar a junção com as Forças Avançadas e efetivar a ocupação, ao mesmo tempo, empregando ao máximo a superioridade militar venezuelana. Como a Defesa avalia a possibilidade das Forças Mecanizadas e Blindadas da Venezuela contornarem os terrenos alagadiços através do norte de Roraima para atingir rapidamente seus objetivos?
As Forças Armadas estão posicionadas estrategicamente e em estado de permanente prontidão, a fim de cumprir suas respectivas missões constitucionais de garantir a soberania do território nacional.
3.1. Quais os meios e ações para se contrapor a essa possibilidade já foram efetuados na área?
As Forças Armadas estão posicionadas estrategicamente e em estado de permanente prontidão, a fim de cumprir suas respectivas missões constitucionais de garantir a soberania do território nacional.
A ideia de reforçar as guarnições em Roraima, transformando a atual em Regimento de Cavalaria Mecanizada, já estava prevista, uma vez que a região apresenta diversos problemas, como a ocupação ilegal de reservas indígenas, garimpo ilegal, crimes transnacionais, dentre outros.
4. Como a Inteligência Militar avalia a capacidade real de combate da Venezuela? 4.1. Há quantos caças prontos para uso? 4.2. Qual a disponibilidade dos Mísseis S-300VM? 4.3. Qual o nível de treinamento do pessoal? 4.4. Considerando as capacidades estimadas da Venezuela, como a Defesa Nacional pretende garantir a inviolabilidade do Território Nacional, caso a Venezuela avance em suas intenções de incorporar Essequibo?
As Forças Armadas e a Guarda Nacional bolivarianas têm a tarefa de proteger soberania, garantindo a integridade territorial e auxiliando nas operações de segurança interna e combate ao narcotráfico. Eles têm capacidades e financiamento suficientes para cumprir tarefas de segurança interna e o seu papel de proteção do regime, a despeito dos desafios econômicos, baixa disponibilidade de equipamentos e níveis de treinamento com restrição.
As forças armadas mantêm o seu regime de treinamento regular e a cooperação civil-militar aumentou. Há pouca capacidade logística para apoiar missões fora do país. O equipamento é relativamente moderno e grande parte é oriundo da China e Rússia. Embora a crise econômica tenha afetado a capacidade do governo de sustentar despesas militares, impactando em novas aquisições, recentemente foram renovados, mas com pouca robustez, acordos na área de manutenção e modernização dos meios. A indústria de defesa da Venezuela baseia-se numa série de pequenas empresas estatais, focadas principalmente na produção de armas/equipamentos de pequeno porte e munições. A sua indústria naval tem se limitado a construção de pequenas embarcações de patrulha costeira. (fonte: The Military Balance 2024, for The International Institute for Strategic Studies – UK)
4.1. Há quantos caças prontos para uso?
15 F-16A/B e 21 Su-30MKV (fonte: World Directory of Modern Military Aircraft 2024/AEROFLAP DEZ 2023 e The Military Balance 2024, for The International Institute for Strategic Studies – UK).
4.2. Qual a disponibilidade dos Mísseis S-300VM?
02 S-300VM (RS-SA-23). (fonte: The Military Balance 2024, for The International Institute for Strategic Studies – UK)
4.3. Qual o nível de treinamento do pessoal?
As forças armadas mantêm o seu regime de treinamento regular, mas com restrições. (fonte: The Military Balance 2024, for The International Institute for Strategic Studies – UK)
5. A princípio, estão disponíveis um Batalhão de Infantaria de Selva e um Grupo de Artilharia de Campanha de Selva em Roraima. Não parecem suficientes para deter um avanço blindado venezuelano. Qual o Plano de Contingência para reforço daquela região? 5.1. Existem aeronaves suficientes para deslocamento rápido de tropas para a região? 5.2. Caso contrário, existem planos detalhados para mobilização de aeronaves civis compatíveis? 5.3. Existem navios suficientes para deslocamento de tropas e equipamentos (Viaturas Blindadas) para as proximidades da região (Via marítima/fluvial até Manaus)? 5.4. Caso contrário, existem planos para mobilizar Navios Mercantes? 5.5. Existem planos para deslocamento de tropas e equipamentos (Viaturas Blindadas) por via terrestre para essa região? 5.6. Especificamente quanto às Forças de Emprego Rápido do Exército, qual é o efetivo e tempo mínimo para se desdobrar na área em questão? 5.7. Em cada situação, qual o tempo estimado para concentração de tropas na Fronteira Norte? 5.8. Está previsto o envio de munição e suprimentos para manter as Forças Mobilizadas pelo tempo necessário na região em questão? 5.9. Especificamente sobre um eventual enfrentamento, qual a melhor maneira de se contrapor aos T-72? 5.10. Existe provisão de armamento Anti-Carro e Minas Anti-Carro? 5.11. O pessoal está adestrado no seu emprego? 5.12. Qual a ideia de dissuasão ao se anunciar o envio de 20 Viaturas Blindadas Leves Guaicurus para Roraima? 5.13. Foi anunciada a criação de um Regimento de Cavalaria Mecanizado em Boa Vista? 5.14. Qual o tempo de ativação dessa unidade? 5.15. Qual o seu equipamento? 5.16. Estará apta a conter uma ameaça blindada centrada num T-72? 5.17. Estão estimados os recursos para viabilizar essa mobilização?
As Forças Armadas estão posicionadas estrategicamente e em estado de permanente prontidão, a fim de cumprir suas respectivas missões constitucionais de garantir a soberania do território nacional. Cumpre-se um programa de adestramento de pessoal e de aprestamento de meios, para que estejam preparados para alguma eventualidade de emprego.
6. Qual a explicação de seguir mantendo os efetivos militares mais significativos desdobrados no Centro-Sul, enquanto as fronteiras permanecem porosas e com situações de risco estratégico como as que se apresentam? 6.1. Por que manter uma Divisão de Exército inteira na cidade do RJ, quando Roraima tem efetivos tão escassos?
O planejamento e a distribuição territorial das Forças Armadas seguiram uma lógica histórica e vêm sendo atualizados conforme a evolução da conjuntura nacional e internacional. Entretanto, a realocação de pessoal e de recursos materiais demanda uma adequada infraestrutura, que por sua vez demanda elevados recursos financeiros.
7. Sobre a Marinha, além de navios para transporte de tropas e equipamentos, o que mais poderia fazer para apoiar um possível Teatro de Operações Norte? 7.1. Em hipótese de evolução da situação, haveria Submarinos disponíveis para causar prejuízos ao esforço de guerra venezuelano? 7.2. Estas contingências são previstas nos Planejamentos?
A Marinha do Brasil possui meios navais e aeronavais em estado de permanente prontidão. Cumpre-se um programa de adestramento e manutenção do material, para que o pessoal e os meios estejam preparados para alguma eventualidade de emprego.
8. Sobre a FAB, além do provimento de transporte para concentração de forças na Fronteira Norte, qual a disponibilidade dos novos Gripen (em termos de disponibilidade, armamento e pilotos treinados) para participar de uma hipotética ação militar? 8.1. Seria o necessário para garantir a superioridade aérea no hipotético Teatro de Operações, considerando a presença dos SU-30MK e S-300MV? 8.2. Qual a avaliação dos A-29 sediados em Roraima para atuar num hipotético Teatro de Operações, considerando a presença da supostamente forte defesa aérea da Venezuela? 8.3. Qual o nível de treinamento dos pilotos de combate? 8.4. Foi intensificado face aos desdobramentos da crise atual? 8.5. É notória a alta taxa de voos da FAB para o transporte de autoridades. Qual a comparação entre as horas voadas por pilotos de caça e de combate frente aos pilotos do Grupo de Transporte Especial?
A Força Aérea Brasileira possui meios aéreos em estado de permanente prontidão. Cumpre-se um programa de adestramento e manutenção do material, para que o pessoal e os meios estejam preparados para alguma eventualidade de emprego.
9. De maneira geral, existem planos contingentes de mobilização para se contrapor de forma eficaz à uma ameaça de violação do território nacional decorrente da questão de Essequibo?
Sim. O Sistema Nacional de Mobilização (SINAMOB) é composto por órgãos que atuam de modo ordenado e integrado que planejam e executam todas as fases da Mobilização e da Desmobilização Nacionais. Os planos de mobilização são periodicamente revistos e aperfeiçoados. Além disso, são realizados exercícios anuais de mobilização de pessoal reservista.
Atenciosamente,
Brasília, na data de assinatura.
ANDRÉ LUIZ DE ANDRADE FELIX
Vice-Almirante
Chefe do Gabinete do Estado-Maior Conjunto das Forças Armadas