A prisão do general Walter Braga Netto, ocorrida no dia 14 de dezembro de 2024, marca um momento crítico na política brasileira, especialmente em relação às investigações sobre a alegada tentativa de golpe de Estado que se seguiu às eleições de 2022. Braga Netto, ex-ministro da Defesa e da Casa Civil durante o governo Jair Bolsonaro, foi detido pela Polícia Federal sob a acusação de obstrução de justiça. Ele é suspeito de ter tentado interferir nas investigações relacionadas a um plano para contestar a posse do presidente Lula.
A prisão preventiva foi determinada pelo ministro Alexandre de Moraes do Supremo Tribunal Federal (STF), que atendeu a um pedido da Polícia Federal. As autoridades alegaram que Braga Netto estava atuando para obstruir as investigações desde agosto de 2023.
O general é acusado de ter um papel ativo na tentativa de golpe, incluindo a organização e o financiamento de ações que visavam pressionar os comandantes das Forças Armadas e coletar informações sigilosas. Além dele, outras figuras proeminentes também foram indiciadas no mesmo inquérito, incluindo o ex-presidente Jair Bolsonaro.
Prerrogativas de prisão
Braga Netto foi preso em sua residência em Copacabana e posteriormente transferido para uma sala improvisada na 1ª Divisão do Exército, na Zona Oeste do Rio de Janeiro.
Essa instalação foi escolhida devido à sua patente de quatro estrelas, que exige condições especiais de detenção.
O local conta com ar-condicionado, banheiro privativo e outros confortos que não são comuns em prisões convencionais. A decisão de mantê-lo em ambiente militar reflete as prerrogativas dos oficiais das Forças Armadas, que devem ser detidos em instalações militares e não em celas comuns.
Os temores da esquerda política
A situação gerou controvérsias políticas. O deputado federal Lindbergh Farias (PT-RJ) expressou preocupações sobre as condições da prisão, sugerindo que o local poderia se tornar uma “central de conspiração” devido ao status militar do general e suas interações com outros oficiais.
A defesa de Braga Netto nega as acusações e busca contestar a legalidade das investigações.
Este episódio não apenas destaca as tensões políticas no Brasil pós-eleitoral, mas também levanta questões sobre a aplicação da justiça e os direitos dos militares em situações legais.
A continuidade das investigações e o desdobramento dos eventos relacionados à prisão do general serão cruciais para entender o futuro político do país e a estabilidade das instituições democráticas, principalmente no que se refere aos militares.
Aprofundando os temores da esquerda, o Partido dos Trabalhadores, por exemplo, propõe a alteração dos currículos das escolas de formação militar para remover conteúdos considerados antinacionais e antidemocráticos, como o elogio ao golpe de 1964.
Essa proposta foi discutida em resoluções do partido desde 2017 e reafirmada em declarações recentes de líderes do PT, como José Genoino.
A tese dúbia “CPF/CNPJ” de José Mucio Monteiro
Em entrevista à Globo News, o ministro da Defesa, José Múcio Monteiro comentou brevemente sobre a prisão de Braga Netto:
“Há um constrangimento, há um espírito de corpo de cada Força, mas já se esperava. Nós desejamos que todos esses que estão envolvidos respondam à Justiça. (…) É preciso acabar para gente olhar para frente e tirar a suspeição dos inocentes. Cada um entrou nisso com o seu CPFs, e a gente tem que preservar os CNPJs das três Forças”.
A tese de Mucio procura estabelecer uma dicotomia (CPF x CNPJ) entre alguns militares que teriam usado o nome da instituição militar (o CNPJ) para planos pessoais (o CPF). Forçosamente é preciso contrapor à tese de Mucio sua correspondente antítese ocorrida há alguns anos.
Em abril de 2018, às vésperas do julgamento no STF, que definiria se Lula permaneceria preso, o então comandante do Exército Brasileiro, general Eduardo Villas-Bôas, escreveu no Twitter:
“Asseguro à Nação que o Exército Brasileiro julga compartilhar o anseio de todos os cidadãos de bem de repúdio à impunidade e de respeito à Constituição, à paz social e à democracia, bem como se mantém atento às suas missões institucionais.”
O tuíte lacônico, mas controverso – porque contrariava vedação legal de que militares na ativa comentem assuntos políticos – teve peso considerável na eleição do capitão Jair Bolsonaro. Em seu “alerta à nação”, o general que – por força do cargo – representava tecnicamente o Exército (o CNPJ), usou sua rede social pessoal (o CPF) confundindo sua visão política particular com a de toda a tropa.
Na visão de alguns militares ouvidos pela Revista Sociedade Militar (sob a condição de anonimato), a tese dúbia do ministro da Defesa, conquanto responsabilize condutas individuais – caso de Walter Braga Netto, por exemplo – acaba se revelando como escudo protetor de uma coletividade determinada de oficiais generais que eventualmente se camuflam na tropa para conseguir o que for mais interessante para eles.