É até assustador pensar em um cenário desses: caças e bombardeiros venezuelanos cruzando 3.400 quilômetros para atacar Brasília. Parece mais uma ideia saída de um filme ruim de guerra. Mas, com as crescentes tensões regionais e a Venezuela se aferrando ao seu poderio militar como um pilar de sobrevivência política, a pergunta surge na mente de pessoas mais preocupadas: a Venezuela conseguiria bombardear Brasília?
Caças modernos, mas não milagrosos
A Venezuela dispõe de dois tipos de caças de peso: os Su-30MK2, adquiridos da Rússia, e os F-16A, relíquias dos anos 80 que vieram dos Estados Unidos. Vamos aos números.
- O Su-30MK2, a joia da coroa venezuelana, tem alcance de 3.000 a 3.500 quilômetros. No entanto, isso só acontece em condições ideais, ou seja: sem armamento pesado. Adicione mísseis Kh-31 e bombas KAB-500, e a autonomia despenca.
- O F-16A, apesar de lendário, é um velho de guerra – literalmente. Seu alcance máximo, 2.000 quilômetros, os coloca fora de qualquer missão desse porte sem suporte externo, como reabastecimento aéreo. E aí vem o problema: a Venezuela não tem uma frota confiável de aviões-tanque.

Mesmo que possuíssem a capacidade logística, o Brasil não é um alvo desprotegido. Sistemas como o Pantsir-S1 e o Astros 2020 estariam prontos para interceptar qualquer ataque.
Helicópteros de ataque: úteis, mas não para longas distâncias
Se a ideia de caças venezuelanos cruzando o espaço aéreo brasileiro já parece absurda, o uso de helicópteros como o AS532 Cougar ou o MI-17 em um cenário de ataque a Brasília beira o delírio. Esses modelos são eficazes em missões de transporte tático e apoio de fogo em conflitos de curta distância, mas sua autonomia operacional é extremamente limitada para voos de longo alcance.
O MI-17, por exemplo, possui alcance máximo de aproximadamente 950 quilômetros. Isso o torna útil para manobras regionais na fronteira, mas absolutamente impraticável para qualquer tentativa de ação em território brasileiro a essa distância. Portanto, a força de helicópteros da Venezuela está completamente fora de consideração como opção para bombardear ou atacar Brasília.
Além disso, como acontece com os caças, a manutenção desses helicópteros sofre com as sanções econômicas e a falta de peças de reposição. Embora robustos, os modelos russos enfrentam problemas frequentes de operacionalidade devido ao desgaste e à dificuldade em importar equipamentos. O risco para as tripulações seria altíssimo em um cenário de guerra contra um país com defesas bem estruturadas, tornando qualquer tentativa uma missão quase suicida.
O avião-tanque 707: uma peça isolada e insuficiente
A Venezuela conta com um Boeing 707 adaptado para reabastecimento aéreo, um dos poucos recursos que teoricamente poderiam ajudar a ampliar o alcance dos seus caças. No entanto, um único avião-tanque para uma frota inteira é logisticamente inviável para qualquer operação significativa. Além disso, as capacidades do 707 são limitadas pelo seu próprio estado de conservação. Trata-se de mais uma vítima da falta de peças e do sucateamento progressivo da frota venezuelana.
Outro ponto crítico é que, em uma missão real, o 707 seria um alvo fácil para sistemas de defesa aérea. Sem escolta adequada, e considerando os problemas de manutenção dos caças, o avião-tanque provavelmente não conseguiria sobreviver tempo suficiente para cumprir seu papel. Assim, o 707 é mais um exemplo de como o arsenal militar venezuelano é tecnicamente impressionante no papel, mas ineficaz na prática.
A logística que simplesmente não existe
Para chegar até Brasília, os caças venezuelanos precisariam de um sistema de suporte logístico que, ao que tudo indica, Caracas não tem. Não há aviões-tanque suficientes, e as sanções econômicas ao regime de Nicolás Maduro apenas agravaram a situação. Peças de reposição são escassas, e a manutenção das aeronaves é problemática.
De acordo com analistas, grande parte da frota venezuelana está inativa devido à falta de peças e ao desgaste natural. Mesmo que os aviões estivessem prontos, como os pilotos venezuelanos treinariam para uma missão tão complexa, enfrentando sistemas de defesa aérea modernos em território hostil?

Além de todos os obstáculos técnicos, há outro fator incontornável: a diplomacia internacional. Um ataque venezuelano ao Brasil não seria apenas um ato militar, mas uma bomba geopolítica. O Brasil é signatário do Tratado Interamericano de Assistência Recíproca (TIAR), o que significa que qualquer agressão à sua soberania poderia desencadear uma resposta militar coletiva na região.
A Venezuela, apesar de suas relações próximas com Rússia e China, dificilmente teria apoio para uma ação militar direta contra o Brasil. Para Moscou e Pequim, manter estabilidade na América Latina é mais interessante do que apoiar aventuras militares arriscadas de um regime isolado.
Tensões históricas e as novas dinâmicas regionais
Ainda que o Brasil e a Venezuela não tenham histórico de confrontos armados, as relações entre os dois países não são as melhores. A crise humanitária venezuelana e o fluxo migratório massivo para o Brasil, especialmente na região de Roraima, complicaram a dinâmica entre os dois países.
Além disso, o regime de Maduro frequentemente utiliza a retórica militar para desviar a atenção dos problemas internos. Por isso, imaginar cenários como a Venezuela tentando bombardear Brasília não é apenas uma questão de análise militar, mas também de entender como Caracas joga com as narrativas de ameaça externa para consolidar poder internamente.

A ideia de caças venezuelanos bombardeando Brasília parece mais uma distopia do que uma realidade. As limitações técnicas, a falta de suporte logístico e as repercussões diplomáticas tornam essa hipótese altamente improvável. Contudo, em tempos de instabilidade, as improbabilidades podem se tornar ameaças reais – especialmente quando um governo, como o de Maduro, aposta em atos extremos para sobreviver.
Para o Brasil, a lição é clara: a dissuasão começa com a preparação. Fortalecer a defesa aérea, monitorar as movimentações regionais e manter canais diplomáticos abertos são fundamentais para evitar que discussões como essa deixem de ser meras especulações.