Enquanto o Canadá reconsidera suas parcerias no setor de defesa, a Coreia do Sul surge como um fornecedor confiável, capaz de fornecer tecnologia militar avançada de forma eficiente. A recente visita de uma delegação sul-coreana a Ottawa destaca essa tendência, num momento em que a incerteza política nos Estados Unidos está levando vários aliados a diversificarem suas fontes de suprimento militar, conforme noticiado pelo Ottawa Citizen em 10 de março de 2025.
Um grupo de doze representantes da indústria e do governo de defesa da Coreia do Sul se reuniu com autoridades canadenses nos dias 5 e 6 de março, com o objetivo de apresentar sua oferta de sistemas militares, que incluem obuseiros, aviões de treinamento, lançadores de foguetes e submarinos. Além do fornecimento de equipamentos, a proposta sul-coreana prevê o estabelecimento de centros de manutenção no Canadá e o acesso irrestrito à tecnologia incorporada nos sistemas, uma vantagem que os fabricantes dos Estados Unidos nem sempre concedem a seus parceiros internacionais.
Um dos principais destaques dessa oferta é o submarino KSS-III, um modelo de última geração desenvolvido pela Hanwha Ocean. Segundo o almirante aposentado Steve Jeong, atual vice-presidente da empresa, essa plataforma atende aos requisitos das Forças Armadas do Canadá. Jeong destacou que três unidades já estão em operação e que o primeiro submarino poderia ser entregue em um prazo de seis anos após a assinatura do contrato. Com capacidade de submersão por mais de três semanas sem necessidade de emergir e um alcance superior a 7.000 milhas náuticas, o KSS-III se apresenta como uma opção ideal para operações no Ártico.
A Coreia do Sul tem se consolidado como um ator-chave na indústria global de defesa, registrando um crescimento significativo nas exportações de armamentos, especialmente para a Europa. Países como a Polônia assinaram contratos avaliados em mais de 10 bilhões de dólares para a aquisição de tanques, obuseiros autopropulsados, aviões leves e sistemas de mísseis sul-coreanos, enquanto a Romênia fechou um acordo de 1 bilhão de dólares para a compra de obuseiros. Esses contratos incluem mecanismos de produção local que fomentam a criação de empregos e a cooperação industrial.
Marinha canadense e a dependência tecnológica dos EUA
A ascensão da indústria de defesa sul-coreana se deve, em parte, aos desafios enfrentados no passado com fornecedores dos Estados Unidos. Segundo Jeong, os altos custos e a dependência tecnológica limitaram a autonomia da Coreia do Sul, levando o país a desenvolver seus próprios sistemas de defesa. Como resultado, agora pode oferecer equipamentos compatíveis com os padrões da OTAN, evitando ao mesmo tempo certas restrições impostas pelos Estados Unidos às exportações.
Esse cenário coincide com o crescente debate no Canadá sobre sua dependência tecnológica dos Estados Unidos. Um exemplo claro é a frota de caças F-35 adquirida por 19 bilhões de dólares, cujos sistemas de software e hardware permanecem sob controle dos EUA. Da mesma forma, o programa canadense de navios de combate de superfície (CSC), que pode atingir um custo de até 80 bilhões de dólares, incorpora componentes essenciais administrados pelos Estados Unidos, o que pode comprometer a soberania operacional da marinha canadense sobre sua frota naval.
Apesar dessas preocupações, o governo canadense tem mantido sua estratégia tradicional de aquisições militares com os Estados Unidos. Em 2023, o Canadá assinou contratos de quase 30 bilhões de dólares em equipamentos militares norte-americanos, incluindo um acordo de 8 bilhões com a Boeing para aviões de vigilância e outro de 2,5 bilhões para drones. Essa estratégia buscava minimizar as críticas de Washington sobre os níveis de gastos do Canadá com defesa, embora não tenha impedido a administração Trump de aumentar a pressão sobre Ottawa.
A questão da integração militar e econômica com os Estados Unidos continua a dividir autoridades e analistas de defesa no Canadá. Enquanto figuras como o general Rick Hillier defendem um alinhamento mais próximo com Washington, outros, como o vice-almirante aposentado Mark Norman, alertam sobre os riscos de uma dependência excessiva e sugerem medidas econômicas para conter a influência norte-americana.
Nesse contexto, a proposta da Coreia do Sul reflete uma tendência crescente entre os aliados dos Estados Unidos, que buscam diversificar seus fornecedores de defesa. Caso o Canadá opte por seguir nessa direção, isso poderia representar uma mudança significativa em sua estratégia de aquisições, priorizando parceiros que ofereçam soluções tecnologicamente avançadas e acessíveis, sem impor restrições operacionais excessivas.