Em uma movimentação inédita no setor de defesa brasileiro, o Banco Santander se torna a primeira instituição financeira privada a entrar oficialmente no jogo geopolítico e estratégico da Base Industrial de Defesa (BID).
A iniciativa surge como parte de uma nova política de crédito discutida entre o Ministério da Defesa e o banco, com o objetivo de aumentar a competitividade das empresas nacionais no mercado internacional.
A reunião que selou a aproximação aconteceu no dia 5 de maio de 2025, em São Paulo, e contou com a presença do Ministro da Defesa, José Mucio Monteiro, e da Vice-Presidente Executiva do Santander, Maitê Leite.
Além de representantes do banco e do governo, participaram especialistas da indústria de defesa e executivos ligados à exportação de equipamentos militares, reforçando o peso estratégico do encontro.
De acordo com comunicado oficial publicado no site do Governo Federal, a medida visa preencher lacunas deixadas por bancos públicos no financiamento de empresas da Base Industrial de Defesa.
Um passo fora da caixa: crédito privado para além dos bancos públicos
Até agora, as operações de financiamento para a Base Industrial de Defesa estavam concentradas principalmente em instituições públicas como o BNDES ou a FINEP.
O movimento do Santander representa uma quebra de paradigma ao abrir espaço para que bancos privados financiem segmentos estratégicos até então negligenciados por políticas tradicionais.
“Foram discutidos financiamentos para áreas que os bancos públicos não costumam atender, como serviços no exterior, recuperação de equipamentos, manutenção e exportações específicas“, explicou o ministro José Mucio.
Isso inclui, por exemplo, sistemas de mísseis, radares, blindados, munições inteligentes e softwares militares, que costumam demandar investimentos robustos e prazos longos — fatores que nem sempre se encaixam nas linhas de crédito convencionais.
BID brasileira movimenta bilhões e tem espaço para crescer
A Base Industrial de Defesa (BID) brasileira é uma engrenagem invisível, porém vital, para a soberania nacional e para a economia.
Composta por empresas públicas e privadas, a BID atua em todas as etapas do ciclo de vida de produtos estratégicos, desde a pesquisa e o desenvolvimento até a produção, distribuição e manutenção.
Atualmente, a BID responde por cerca de 3,58% do PIB brasileiro e gera aproximadamente 2,9 milhões de empregos diretos e indiretos.
Segundo dados atualizados do Ministério da Defesa, em 2024, o Brasil bateu um recorde de US$ 1,8 bilhão em exportações do setor, vendendo para mais de 140 países — o que inclui nações da América Latina, África, Oriente Médio e sudeste asiático.
Esse desempenho robusto reforça o papel da BID como uma das apostas estratégicas do país no século XXI, especialmente diante de um cenário global em que os investimentos militares crescem impulsionados por tensões regionais, guerras prolongadas e a corrida por autonomia tecnológica.
Apoio financeiro e garantias que destravam o mercado
Além do novo apoio do Santander, as empresas da BID também contam com o suporte da Associação Brasileira Gestora de Fundos Garantidores e Garantias (ABGF) e do Fundo de Garantia à Exportação (FGE), que atuam como âncoras para operações internacionais, oferecendo proteção contra riscos comerciais e políticos.
Essas instituições viabilizam, por exemplo, a exportação de aeronaves da Embraer para forças aéreas estrangeiras, ou a venda de armamentos desenvolvidos pela Avibras, Taurus, Condor, Imbel e outras gigantes do setor.
Com a entrada do Santander, a expectativa é que mais empresas brasileiras possam acessar linhas de crédito customizadas para atender à demanda global, muitas vezes urgente e com alto nível de exigência técnica.
Mais autonomia, mais defesa, mais Brasil
A ampliação do financiamento privado é vista por analistas como um passo decisivo para a autonomia estratégica do Brasil, que ainda depende de alguns fornecedores externos para partes sensíveis de seus sistemas de defesa.
Se mais bancos privados seguirem o exemplo do Santander, o país poderá ampliar sua capacidade de desenvolver soluções militares próprias e reduzir a vulnerabilidade diante de embargos ou disputas comerciais internacionais.
A iniciativa também se alinha à Política Nacional de Exportação de Produtos de Defesa, que prevê o fortalecimento da indústria nacional como forma de garantir a independência tecnológica e industrial do Brasil, algo especialmente relevante em tempos de instabilidade geopolítica global.
Com essa aproximação entre governo e iniciativa privada, o Brasil sinaliza que está disposto a investir em soberania, inovação e competitividade.