A implementação de uma nova política salarial para militares das Forças Armadas, iniciada em 2019, por meio de projeto de lei apresentado pelo Ministério da Defesa, caiu como uma bomba sobre o chamado espírito de corpo das instituições militares brasileiras. Com um texto claramente voltado para o estabelecimento de privilégios para as altas patentes, que em paralelo já maquinavam o recebimento do chamado “ * teto duplex”, o projeto de lei chegava a propor para os oficiais generais uma gratificação de representação vitalícia, independente de estarem na ativa ou reserva.

A estratégia dos generais para aprovar o projeto passou pela entrega de condecorações para políticos, almoços com partidos de esquerda e até convites para passeios por unidades militares sediadas na Amazônia. Entretanto, a coisa quase foi por água abaixo por conta da inesperada reação das baixas patentes e pensionistas, que – inconformados com a injustiça – se manifestaram veementemente dentro do próprio Congresso Nacional, atraindo a atenção de parlamentares de direita e de esquerda, que consideraram justa a sua argumentação.

Entre vários disparates contidos no projeto de lei constava uma gratificação que, enquanto para generais chegava a 73%, para cabos, soldados e suas viúvas perfazia o total de 0% ou bem próximo disso.

As forças armadas fizeram o possível para impedir manifestações de insatisfação, alguns militares da reserva remunerada foram punidos administrativamente por se manifestar publicamente, o que lhes é permitido por lei. O projeto acabou passando, o que causou enorme desagregação dentro das instituições armadas. Pesquisa realizada entre leitores da Revista Sociedade Militar apontou que mais de 70% dos militares não confiam mais nos oficiais generais para resolver questões salariais de toda a tropa.

A promessa do almirante

No final de 2021, já prevendo uma candidatura de Bolsonaro para a reeleição, o então comandante da marinha, Almir Garnier, chegou a admitir que a nova política salarial precisava de correções. Em fala divulgada nos canais oficiais da força o oficial disse que  Bolsonaro buscaria uma forma de corrigir os erros que acabaram prejudicando muitos militares e pensionistas. Admitiu erros, disse que foi uma abordagem meritocrática e se referiu aos prejudicados como os que “ficaram de fora”.

“O presidente Bolsonaro, o Ministro da Defesa, nós os comandantes das Forças… todos os oficias que conduzem, buscarão algum tipo de compensação para aqueles que ficaram de fora dessa abordagem mais meritocrática…”.

Jair Bolsonaro não foi reeleito, sepultando a declarada intenção do almirante de tentar corrigir os equívocos na lei que regula os salários dos militares. Garnier foi um dos oficiais que se mostrou mais inconformado com a derrota de Jair Bolsonaro. Talvez não quisesse sair da Marinha com a má fama de ser aquele que deixou de cumprir uma promessa para com seus próprios subordinados, entre eles muitos graduados que o ajudaram a chegar onde chegou.   

Uma história mal contada

Apesar de ser alardeado pela imprensa que os militares teriam sido beneficiados financeiramente durante o governo Bolsonaro, há uma grande parcela que não foi contemplada com nenhuma melhoria. A parcela dos que “ficaram de fora”, justamente os mais humildes, continua sem a chamada (e prometida) correção das discrepâncias e irregularidades contidas na lei 13.954, sancionada em dezembro de 2019.

* Teto duplex foi a permissão para que militares em cargos comissionados pudessem extrapolar o teto constitucionalmente estabelecido.

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