Conforme notícia publicada ontem, sexta-feira, 20 de outubro, a Casa Civil da Presidência da República anunciou a demissão dos servidores Eduardo Izycki e Rodrigo Colli da Agência Brasileira de Inteligência (Abin). Os desligamentos foram publicados em edição extra do Diário Oficial da União (DOU) e assinados pelo ministro Rui Costa.
Os dois servidores teriam utilizado o conhecimento sobre o uso indevido do programa como meio de coerção indireta para evitar a demissão.
Pela manhã, a Polícia Federal deflagrou a Operação Última Milha, com o objetivo de investigar o uso indevido, justamente pelos dois servidores da Abin, de um sistema de geolocalização de dispositivos móveis, sem a devida autorização judicial.
Ambos foram presos na Operação, que incluiu o cumprimento de 25 mandados de busca e apreensão em diversos estados. As medidas judiciais foram expedidas pelo Supremo Tribunal Federal (STF).
De acordo com a PF, o sistema de geolocalização utilizado pela Abin é um “software intrusivo na infraestrutura crítica de telefonia brasileira. A rede de telefonia teria sido invadida reiteradas vezes, com a utilização do serviço adquirido com recursos públicos”.
Arapongagem estatal, uma história que não é nova, que insiste em se repetir.
ARAPONGAGEM FAZENDO ESCOLA
Em agosto de 2021, a Revista Sociedade Militar publicou com exclusividade excertos de diversos relatórios periódicos produzidos pelo Exército Brasileiro durante a tramitação do Projeto de Lei de reestruturação da carreira militar, que se transformou na Lei nº 13.954/2019.
Segundo o que foi apurado dos relatórios, o Exército teria ainda designado setores de inteligência especializados em internet, redes sociais etc., exclusivamente para o monitoramento de redes sociais e perfis de parlamentares e de militares que atuavam na Câmara dos Deputados e Senado Federal com o objetivo de modificar itens do então PL nº1.645/2019.
Os relatórios de monitoramento demonstravam que setores de inteligência e comunicação social estariam atuando de forma intensa tentando mensurar a reação dos públicos civil e militar a cada movimento da proposta apresentada na câmara no início de 2019.
Entre os perfis de parlamentares acompanhados de perto estavam alguns pertencentes a deputados de esquerda como o do deputado Marcelo Freixo, Glauber Braga e Paulo Ramos. Todavia, parlamentares considerados como de direita também estavam na mira da espionagem, como o deputado subtenente Gonzaga e outros.
ACIMA DA LEI, EM NOME DO DINHEIRO
Pouco mais de um mês depois, a Revista Veja replicou a reportagem exclusiva da RSM. A matéria da Veja trouxe um resumo certeiro da operação de espionagem levado a cabo pela cúpula das Forças Armadas, em especial do Exército:
“É a primeira vez que se tem registro da mobilização das Forças Armadas, com uso de pessoal e recursos das seções de Defesa Cibernética, de Inteligência e de Comunicações, numa ação abrangente e sistemática de rastreamento, vigilância e coleta eletrônica de dados de civis, militares, empresas privadas e entidades associativas dentro do território nacional. E com finalidade política.”
A finalidade foi não apenas política, mas político-financeira. A aprovação do projeto de lei que modificou não só a estrutura das Forças, mas também alavancou o salário dos militares de postos mais elevados, não contava com a simpatia dos parlamentares, pois deixava as categorias de base no prejuízo.
Nessa atmosfera pouco favorável, os detentores do poder fardado não titubearam em usar a espionagem e o monitoramento ilegal e inconstitucional para fazer valer seus interesses classistas. Com isso, mais uma vez o Estado se curvou à vontade antipopular de uma de suas elites históricas.
Texto de JB Reis