A ministra Carmen Lúcia, do Supremo Tribunal Federal (STF), determinou ao Superior Tribunal Militar (STM) que dê a um pesquisador acesso integral às gravações das sessões públicas e secretas de julgamentos ocorridos naquele tribunal na década de 1970.
O referido pesquisador busca o material para subsidiar pesquisa sobre julgamentos na época da ditadura militar. A decisão se deu na Reclamação (RCL) 57722.
No pedido, o pesquisador, que também é advogado, argumenta que apesar de o STF, em duas ocasiões, ter determinado ao STM que fornecesse acesso integral aos registros, as gravações disponibilizadas (mais de 10 mil horas) foram digitalizadas, mas não contemplam a totalidade das sessões de julgamento realizadas e dos processos apreciados.
Ele afirma que negar acesso a todo o material termina “camuflando sofrimentos e abusos e gera um saudosismo falso de tempos em que a lei não era observada, os direitos humanos afrontados sistematicamente, e a legalidade inexistente“.
Em informações prestadas na ação, o STM afirmou que foi dado acesso integral a registros fonográficos do período entre 1975 e 2004, inclusive com 2 mil horas de sessões secretas.
Alegou, ainda, que parcela das sessões não foi disponibilizada por não ter ocorrido a gravação ou porque os registros, realizados em fitas magnéticas e com equipamentos de captação “rudimentares”, estariam com sua integridade comprometida.
DIREITO À INFORMAÇÃO
Na decisão, a ministra Carmen Lúcia observou que o acesso determinado pelo STF às gravações foi amplo, irrestrito e integral, sem limitação sobre a qualidade dos registros ou eventual comprometimento da integridade.
Ela salientou que, conforme decidido anteriormente pelo Supremo, quando se trata de direito à informação, não há espaço para a discricionariedade, e que apenas a proteção ao interesse público ou a defesa da intimidade podem legitimar sua restrição.
A relatora determinou que o STM deve colocar à disposição do pesquisador todo o material requerido, independentemente do estado em que esteja, cabendo a ele avaliar a utilização do conteúdo ou, até mesmo, providenciar, às suas custas, sua eventual restauração.
No caso acima, essa possibilidade deve ser comprovada ao tribunal militar.
A decisão estabelece que o STM também terá que informar a existência ou não das sessões secretas indicadas pelo pesquisador, de forma que seja esclarecida sua suspeita sobre eventual ocultação de parte dos documentos pleiteados.
Em relação a dados relacionados à intimidade e aqueles cujo sigilo seja necessário para proteção da sociedade e do Estado, o STM deverá motivar de forma explícita e pormenorizada o não fornecimento.
Aumentar a representatividade no Conselho Nacional de Justiça
Integrantes da Justiça Militar lutam por duas frentes: aumentar sua representatividade no Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e ampliar sua competência para julgar casos cíveis. Ambas as propostas geram debate entre especialistas, com argumentos a favor e contra.
Uma proposta de emenda constitucional (PEC) em tramitação no Senado visa aumentar o número de cadeiras no CNJ de 15 para 18, incluindo um representante da Justiça Militar. A ideia é garantir voz e voto aos militares nas decisões do Conselho, que regula e fiscaliza o Poder Judiciário.
Atualmente, o CNJ não possui nenhum membro oriundo da Justiça Militar, o que tem sido motivo de insatisfação entre os integrantes desse ramo do Judiciário.
A falta de representatividade militar no CNJ tem sido uma queixa antiga da Justiça Militar, que se submete às decisões do conselho sem ter voz ativa. A proposta de inclusão busca corrigir essa lacuna, permitindo que a Justiça Castrense tenha participação nas deliberações e decisões do órgão responsável pelo controle administrativo e financeiro do Poder Judiciário.
Os que são contra a inclusão de militares no CNJ alegam que ela poderia ser vista como uma forma de militarização do CNJ, contrariando a ideia de um Judiciário independente.
O caso da Reclamação (RCL) 57722, a respeito da resistência da STM em obedecer à determinação do Supremo Tribunal Federal, – exemplo cristalino do adágio militar “um manda, o outro obedece” – já fornece algum prognóstico do que pode se transformar o Conselho Nacional de Justiça.