Oficiais generais evitam comentar sobre os próprios salários, com excessão de Augusto Heleno que mencionou logo no início do governo Bolsonaro que com salário de 19 mil reais não conseguia frequentar restaurantes dignos. Entretando, a busca por obter vantagens salariais é constante, feita de maneira silenciosa e quase sempre eficaz. Um movimento interessante e pouco perceptivel, realizado no início de 2021 pelos oficiais generais que faziam parte do primeiro escalão, chamou a atenção. Uma portaria repentinamente publicada pra valer a partir do mês de maio de 2021, com o Brasil assolado pela COVID, mês com 59 mil mortes, elevou os salários em até 80% para os generais que ocupavam cargos comissionados. Com o movimento, alguns oficiais passaram a receber valores que ultrapassavam a cifra dos 60 mil reais.
Em 10 de maio de 2021, questionado pelo Metrópoles, o então vice-presidente Hamilton Mourão disse que não era ilegal, dado a criação da nova regra, mas que não considerava ético: “Questionado sobre a portaria, principalmente no momento econômico e orçamentário que o país vive, Mourão disse: ‘Eu continuo com a mesma posição, é legal, mas não considero ético que, no momento, isso aconteça’ “.
A declaração de Mourão, junto com a inércia do presidente à época em impedir tal ação, somadas a uma declaração de Paulo Guedes potencia a desconfiança de que algo poderia estar errado. O então ministro da economia, muito poderoso e com alto status na época, paradoxalmente disse não ter poderes para impedir o movimento, que acabou praticamente dobrando o salário de vários generais que compunham o primeiro escalão do governo Bolsonaro.
Hoje há quem diga, entre eles o deputado Glauber Braga (Psol-RJ), que o então presidente sofreu algum tipo de pressão ou fez acordo com parte de membros políticos da cúpula das Forças Armadas e que os aumentos salariais disfarçados concedidos para estes e não para a tropa como um todo, podem ser parte de um trato para que continuasse recebendo o apoio destes.
Na época a Revista Sociedade Militar revelou em artigo a fala de Paulo Guedes, que em junho de 2021 se manifestou contra a concessão do benefício. Porém, admitiu que não tinha superpoderes para impedir o reajuste especial dos generais. Na época o General Fernando Azevedo recebia salário de R$ 62,91 mil; general Heleno, R$ 61,4 mil; e general Braga Netto, R$ 60,4 mil, quando o teto remuneratório estava na casa dos 40 mil reais no país.
“A legislação é feita pelos senhores … e tenho a minha consultoria jurídica, que diz: Olha, Ministro, o senhor não pode se manifestar sobre isso. O senhor pode dizer que a Economia não sanciona isso aqui … Entretanto a legislação é feita pelos senhores… talvez seja a hora de enfrentar isso, ponto. O que eu penso todo mundo sabe. Eu não defendo a austeridade? Então todo mundo sabe o que devo pensar de “teto duplex”, o que devo pensar de supersalários. Todo mundo deve saber o que penso. Mas não tenho superpoderes “
Militares ouvidos pela Revista Sociedade Militar também viram com suspeição o crescimento abrupto das vantagens concedidas para generais.
“… não há como não criar suspeição sobre essa manobra, onde os Generais saíram de um salário bruto de R$19 mil reais para mais de 60 mil, não existe “milagres da multiplicação de renda” o que existiu de certo foram contrapartidas, as quais incluiu o abandono aos praças veteranos e as Pensionistas “, diz Suboficial da Reserva da marinha do Brasil Zacarias, morador de São Gonçalo, Rio de Janeiro.
Até hoje não se sabe se de fato a repentina e inusitada PORTARIA SGP/SEDGG/ME Nº 4.975, de 29 de abril de 2021 fez parte de algum trato entre Bolsonaro e os Militares. Para o deputado Glauber Braga (Psol-RJ) as vantagens concedidas para a cúpula das Forças Armadas durante o último governo, incluindo as medidas impostas pela lei da reestruturação, que beneficiou a cúpula e esqueceu da base militar, são suspeitas.
“… esse apoio à ação golpista, tem um marco que precisa ser analisado com uma lupa, foi a aprovação da lei 13.954 que deu aos generais uma ampliação exponencial de privilégios e colocou praças em dificuldade, abandonou praças para privilegiar generais…”, diz o deputado.
A Lei 13.954/19, colocada em prática pelo governo bolsonaro, não somente feriu um código de Honra, abandonando soldados no campo de batalha, como também foi utilizada como barganha junto a um grupo de Oficiais pra tentar ter força pra um golpe contra as liberdades democráticas. pic.twitter.com/m6k4AUjQ8y
— Glauber Braga (@Glauber_Braga) March 1, 2024