Em uma manifestação impressionante e – para alguns – incômoda, de diplomacia estratégica, o Irã parece estar consolidando sua presença na América Latina. Nas últimas semanas o evento emblemático que chama a atenção para essa questão ocorreu em 17 de abril, foi a marcante presença de militares brasileiros das Forças Armadas, incluindo dois oficiais generais, um da Marinha do Brasil e outro do Exército Brasileiro, além de oficiais e graduados da guarda pessoal da presidência da república, nas celebrações do Dia das Forças Armadas Iranianas.
O evento, realizado no Clube da Aeronáutica, noticiado com antecedência e em primeira mão pela Revista Sociedade Militar, não foi interpretado pela sociedade como apenas um gesto de camaradagem militar. Nas redes sociais as críticas aos militares alcançaram uma escala surpreendente. Mas, o episódio não é isolado, é parte de um avanço calculado dos iranianos e mostra que já há laços bastante consolidados entre o Irã e a esquerda latino-americana, incluindo a brasileira.
A reação nas redes sociais
Uma postagem da Revista Sociedade Militar sobre o evento patrocinado pela Embaixada iraniana no Brasil, feita em 18 de abril de 2024, alcançou mais de 110 mil interações, com 799 comentários, sendo que mais de 88% deles foram em tom de crítica contra os militares das Forças Armadas Brasileiras.
” @Jacksontoledo6: “Nada é tão ruim que não pode piorar” e não é que os conseguiram piorar mesmo É Flórida ou fróids?”; “@PatriotaOnline: Alguém aí já disse que estamos nos posicionando do lado errado da história?”; “@MarcioMR22: Essa aliança das nossas FAs com terroristas é vergonhosa”
https://twitter.com/SocMilitar/status/1780990144662680033
No início do evento o Coronel Mahdi Moghaddam mencionou os laços entre iranianos e militares do Brasil: “A cooperação militar entre o Irã e o Brasil tem uma longa história e, ambas as partes, sempre se manifestaram satisfeitas com esse nível de cooperação. Estas áreas de cooperação nos permitem o uso desse potencial ao serviço e a favor da segurança e da paz, sendo a realização deste evento uma boa marca e contribuição para atingir essas virtudes importantes. Espero que as relações na área da defesa entre Irã e o Brasil se tornam cada vez mais abrangentes.”
Soft power
A diplomacia iraniana, conforme desenvolvida nos últimos anos, opera em múltiplas frentes. Uma das mais significativas é a sua habilidade de cultivar uma imagem positiva através de uma abordagem de soft power. Essa estratégia se desdobra em três níveis principais: iniciativas de camaradagem conduzidas pelas embaixadas iranianas, uma forte presença nos meios de comunicação social e uma atividade intensa nas redes sociais.
Curiosamente, algumas dessas plataformas são proibidas dentro do próprio Irã, destacando uma aparente contradição na sua política interna versus externa. O país mantém um canal de TV em espanhol, onde divulga conteúdos “anti-imperialistas”. O ministro das relações exteriores do país, H.Amirabdollahian, possui mais de 270 mil seguidores no Twitter, sendo que – paradoxalmente – a ferramenta de mídia social é proibida no país.
A narrativa iraniana, voltada para a América Latina, ressalta um discurso anti-imperialista, com oposição forte aos Estados Unidos da América e a necessidade de se estabelecer uma nova ordem mundial. Esse apelo parece encontrar eco especialmente entre os governos de esquerda da região, como evidenciado pela aproximação com lideranças brasileiras, incluindo afagos do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva a líderes iranianos. Este alinhamento ideológico tem, sem dúvida, fortalecido as relações bilaterais, com a esquerda latino-americana encontrando no Irã um aliado contra o que percebem como intervenções ocidentais.
No coração dessa aliança estão também valores compartilhados que transcendem a simples política. O Irã enfatiza constantemente os princípios do Islã Xiita, ao mesmo tempo que destaca a importância da religião na consolidação de valores universais como lealdade e família. Esta dualidade na mensagem iraniana — promovendo valores religiosos estritos em casa enquanto prega a tolerância e a solidariedade internacionalmente — é uma faceta crucial de sua política externa.
Os eventos recentes, acima mencionados, como a participação de militares brasileiros nas celebrações iranianas, não apenas fortalecem as relações militares entre os dois países, mas também são um sinal de uma convergência ideológica crescente. Para a esquerda brasileira e outras administrações similares na América Latina, a parceria com o Irã é vista não apenas como uma aliança estratégica, mas também como uma afirmação de suas próprias posturas políticas.
A aliança entre o militares iranianos e brasileiros é vista por muita gente como abominável, principalmente quando se consideram as críticas frequentes sobre os direitos humanos no Irã, especialmente relacionadas à sua política sobre homossexualidade e as severas penas de morte, ou o apoio às ações dos palestinos da Faixa de Gaza.. Todavia, a relação tende a se ampliar caso a esquerda latino-americana permaneça hegemônica. No evento o adido militar disse que podem ocorrer intercâmbios e exercício militares entre os dois países:
“A atracação de esquadrões navais da Marinha da República Islâmica do Irã em portos de diferentes países do mundo, e no ano passado, na comemoração do 120º aniversário das relações diplomáticas entre o Irã no Rio de Janeiro, bem com a realização de intercâmbios militares e educacionais, a troca de delegações esportivas militares e a realização de exercícios conjuntos…”
Robson Augusto – Revista Sociedade Militar (Militar R1, especialista em inteligência e marketing)