Entre os 23 militares denunciados pela Procuradoria-Geral da República (PGR) por participação na tentativa de impedir a posse do presidente Lula, apenas um deles é visto pela cúpula das Forças Armadas como tendo chance de escapar da condenação no Supremo Tribunal Federal (STF). O nome em questão é o do general de duas estrelas Nilton Diniz Rodrigues, que à época dos fatos era assistente do então comandante do Exército, general Freire Gomes.
A avaliação interna, feita por militares de alta patente em caráter reservado, é de que Nilton Diniz teve envolvimento periférico e circunstancial com a trama golpista que culminou na invasão das sedes dos Três Poderes em 8 de janeiro. Segundo essa leitura, o general foi envolvido na investigação por sua posição hierárquica próxima ao comando, e não por ações diretas ou lideranças na articulação.
De acordo com a denúncia, o nome de Nilton aparece em nove menções, todas ligadas a uma reunião que discutiu a redação da chamada “Carta ao Comandante do Exército de Oficiais Superiores da Ativa do Exército Brasileiro”. O documento, compartilhado em grupos de WhatsApp, buscava pressionar o comandante do Exército a apoiar ações golpistas.
General foi citado em mensagens de coronéis que organizavam reunião com forças especiais
Nilton Diniz Rodrigues foi incluído pela PGR no chamado “núcleo 3” da suposta organização golpista. Esse grupo é composto por um policial federal e militares da ativa e da reserva, entre eles os chamados “kids pretos”, acusados de tramar o sequestro e até a execução de autoridades públicas. O julgamento da denúncia contra esse núcleo está previsto para ocorrer entre os dias 8 e 9 de abril na 1ª Turma do STF.
Em mensagens trocadas entre os coronéis Bernardo Romão Corrêa Netto e Fabrício Moreira de Bastos, Nilton é citado como figura de apoio para organizar uma reunião em Brasília. O objetivo era reunir militares das Forças Especiais para debater como influenciar seus superiores. A reunião teria ocorrido em 28 de novembro de 2022, em um salão de festas na Asa Norte, em Brasília.
Além de Corrêa Netto e Fabrício Bastos, o então ajudante de ordens do presidente Jair Bolsonaro, Mauro Cid, também foi informado sobre o encontro. A investigação aponta que os diálogos tinham como objetivo pressionar os comandantes do Exército a aderirem ao plano de ruptura institucional.
Proximidade com o comando do Exército foi usada como justificativa para inclusão de Nilton na denúncia
Segundo a denúncia apresentada pelo procurador-geral Paulo Gonet, os organizadores da reunião buscaram envolver militares com treinamento tático e influência hierárquica para dar força à movimentação. Nilton Diniz foi citado por sua posição estratégica junto ao comandante Freire Gomes, que, segundo os próprios militares, era contrário a qualquer ação golpista.
O procurador destacou que a presença de Nilton seria fundamental para viabilizar o apoio dentro da alta cúpula do Exército. No entanto, apesar das menções, não há indícios concretos de que o general tenha coordenado ações práticas para a efetivação do plano golpista.
Dentro das Forças Armadas, já se discute as sanções internas que devem ser aplicadas aos militares denunciados, caso eles se tornem réus. A legislação militar prevê o congelamento funcional de oficiais sub judice, impedindo promoções, transferências, licenças e cursos.
Militares denunciados podem ter carreiras paralisadas; Nilton pode escapar
De acordo com fontes militares, o status “sub judice” já é visto como um castigo severo, mesmo antes de qualquer condenação. “É como se eles ficassem congelados”, afirmou um general que acompanha o caso. A punição atinge diretamente a progressão na carreira e o futuro dos envolvidos dentro das Forças Armadas.
Nilton Diniz Rodrigues, atualmente comandante da 2ª Brigada de Infantaria de Selva, aparece, até o momento, como o único que pode ser “poupado” pelo Supremo Tribunal Federal, segundo avaliação reservada da cúpula militar. Os demais integrantes do núcleo 3 são acusados de crimes como tentativa de golpe de Estado, abolição violenta do Estado Democrático de Direito e organização criminosa armada.
A informação foi divulgada por Malu Gaspar – O Globo, em reportagem publicada com detalhes sobre a denúncia, mensagens interceptadas e o julgamento previsto no STF. O texto também lista todos os denunciados e o contexto em que cada nome foi incluído no processo.
O julgamento do caso, considerado um dos mais emblemáticos desde os atos antidemocráticos de 8 de janeiro, será acompanhado de perto pelas Forças Armadas e pela sociedade civil, podendo estabelecer precedentes sobre a responsabilização de militares por ações políticas extremistas.