As Forças Armadas brasileiras não estão aptas a sustentar uma guerra moderna. A afirmação é dos professores de Relações Internacionais da ESPM (Escola Superior de Propaganda e Marketing) Gunther Rudzit e Leonardo Trevisan em artigo de opinião conjunto publicado no jornal O Globo em 5 de abril sob o título Brasil tem de se preparar para a nova versão da lei da selva.
“Não dispomos da efetiva capacidade de ação conjunta, já que o Estado-Maior Conjunto das Forças Armadas não tem as mesmas atribuições hierárquicas de seus equivalentes das melhores Forças Armadas do mundo”, argumentam.
Os professores ainda colocam na conta o fato de o Brasil não contar com uma base industrial de defesa própria e de ser dependente de equipamentos dos Estados Unidos e aliados.
“Ainda não temos a capacidade de consciência situacional própria, o que dificultaria até mesmo saber o que atacar”.
Para Rudzit e Trevisan, reverter a situação exige mudanças profundas e são fatalistas ao prever as possíveis consequências da inércia brasileira frente à mudança da dinâmica geopolítica mundial.
“Se a classe política não tomar a iniciativa de fazer tais alterações, como aconteceu em todos os países desenvolvidos e democráticos, talvez tenhamos de fazê-lo após uma derrota militar. Isso custará muito mais caro, tanto em vidas quanto em interesses nacionais. Sem esquecer, obviamente, o custo financeiro de colocar a tranca depois da porta arrombada”.
Demais especialistas concordam que as Forças Armadas Brasileiras não estão preparadas para uma guerra
Gunther Rudzit e Leonardo Trevisan não são os únicos a argumentarem que as Forças Armadas Brasileiras estão despreparadas para enfrentar uma guerra moderna.
Carlos Eduardo Martins, professor do Instituto de Relações Internacionais e Defesa da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro), acredita que estejamos em uma conjuntura histórica perigosa para a humanidade.
“Penso que estamos vivenciando um período irreversível de declínio à unipolaridade e possível transição para a multipolaridade, que gera conflitos, resistências e riscos de conflitos locais com alto potencial de espalhamento e difusão”.
Em entrevista ao portal Revista Sociedade Militar, o especialista afirmou que o Brasil peca na forma com que conduz a defesa.
“O Brasil, além de gastar pouco em defesa, gasta mal: 78% dos gastos se dirigem a pagamento de pessoal, enquanto na OCDE [Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico] essa rubrica é bem mais baixa, em torno de 50%, o que contribui para a obsolescência tecnológica de nossas Forças Armadas”.
A professora de Defesa e Gestão Estratégica Internacional da UFRJ, Adriana Marques, também criticou o atual modelo de Defesa do Brasil em entrevista concedida à Revista Sociedade Militar em 20 de fevereiro.
Segundo a especialista, que é Doutora em Ciência Política pela USP e Mestra em Ciência Política pela Unicamp, no Brasil “as Forças Armadas estão muito voltadas para atividades domésticas e, em particular, que não são de natureza militar”.
“Você não tem uma discussão sobre quais são os desafios que o Brasil enfrenta no âmbito internacional e de como você pode redesenhar as Forças Armadas a partir desse desafio internacional”.
Comandante da Marinha, Almirante Marcos Sampaio Olsen admitiu situação beligerante do mundo
Em artigo publicado no Correio Braziliense em 6 de março, o Almirante Marcos Sampaio Olsen, Comandante da Marinha, afirmou que no Brasil, devido à “baixa percepção de ameaça” associada à “acanhada mentalidade de defesa”, há “desafios consideráveis na busca contínua por obter e manter capacidades compatíveis com a estatura política estratégica do país”.
“Os reptos a serem enfrentados pelos Combatentes Anfíbios de hoje não são menores que os de sempre. A segurança internacional se vê sob grave risco. Os países têm aumentado significativamente os gastos militares, buscando dotar as Forças Armadas condizentes com o grau da ameaça”.
PEC 55/2023 pretende ser uma das boias de salvação do Brasil da inércia militar
Uma das ferramentas projetadas para tentar atenuar a situação de penúria da Defesa brasileira é a PEC 55/2023, que destina no mínimo 2% do PIB (Produto Interno Bruto) para a Defesa. A Proposta de Emenda à Constituição é um dos grandes objetivos do ministro da Defesa José Múcio Monteiro e do governo Lula.
Segundo o autor da PEC, senador Carlos Portinho (PL-RJ), a proposta prevê um mínimo de previsibilidade no orçamento, pois “o Brasil não pode ter uma conta pendurada com fornecedores” de aeronaves e outras tecnologias.
“Sim, a gente tem um orçamento engessado com investimento em educação e saúde, que são fundamentais para desenvolvimento do País, mas a gente tem de pensar na necessidade de garantir o mínimo de previsibilidade para os investimentos de nossa Defesa, pois sem Defesa não há território, Nação, Educação e Saúde. Não há povo. O mundo está mostrando isso. As relações estão mais tensas nas fronteiras da Europa, e a gente tem de olhar para o Brasil”.