Desde 2017, o ‘The Economist’ alertava sobre a transformação do Exército Brasileiro em uma força policial de fato, destacando a atuação militar em áreas como Tabatinga, na tríplice fronteira entre Brasil, Colômbia e Peru.
Essa tendência se intensificou nos últimos anos, culminando em uma série de operações de Garantia da Lei e da Ordem (GLO) decretadas pelo governo federal.
Em 2024, a discussão sobre o papel das Forças Armadas na segurança pública voltou à tona. Desde o início de seu mandato, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) se mostrou reticente em recorrer às operações de GLO.
Em outubro do ano passado, Lula reiterou que, enquanto estivesse na presidência, não haveria GLOs, embora tenha autorizado uma operação para atuar em portos e aeroportos do Rio de Janeiro, alegando que essas eram áreas federais e não urbanas.
Essa operação foi prorrogada até junho de 2024, com militares atuando nos portos do Rio de Janeiro, Itaguaí e Santos, além dos aeroportos de Guarulhos e Galeão.
No entanto, a operação de GLO terminou na última terça-feira, dia 4 de junho, sem uma nova prorrogação, conforme confirmado por fontes dos Ministérios da Justiça e da Defesa. A decisão final coube ao presidente Lula, que optou por não renovar a medida.
O retorno das GLOs é uma questão sensível e polêmica. Desde 2010, com a ocupação do Morro do Alemão, essas operações têm sido uma ferramenta frequente em crises de segurança pública.
A intervenção federal na segurança do Rio de Janeiro em 2018 é vista como um ponto crítico para o fortalecimento político dos militares. No entanto, a resistência ao uso das GLOs é significativa, especialmente entre a esquerda, que teme a repetição de práticas do passado e a militarização da segurança pública.
O ministro da Defesa, José Múcio, e o comandante do Exército, general Tomás Ribeiro Paiva, têm trabalhado nos bastidores para diminuir essa resistência.
Múcio argumenta que a recente operação no Rio de Janeiro demonstrou a eficácia e segurança do uso pontual dos militares, sem riscos de levantes ou choques de poder. No entanto, críticos apontam que o uso excessivo das GLOs pode minar a confiança nas autoridades civis e resultar em altos custos operacionais.
A crise de segurança no Rio de Janeiro, desencadeada pela morte de um líder miliciano, levou à recente GLO, com a prisão de 3.178 pessoas e a apreensão de 172,3 toneladas de drogas.
Apesar disso, a eficácia das GLOs como solução para a criminalidade é questionada. Parlamentares como Carlos Zarattini (PT-SP) argumentam que a segurança pública deve ser responsabilidade das polícias Federal e Civil, e não das Forças Armadas.
Em resposta às preocupações, o ministro Flávio Dino chegou a considerar uma alteração na legislação para permitir o uso de militares em segurança sem precisar alterar o artigo 142 da Constituição, mas o projeto não avançou.
Gilmar Mendes, decano do STF, também expressou preocupações sobre o uso dos militares em operações de segurança pública, especialmente após o 8 de janeiro.
O debate sobre o papel das Forças Armadas na segurança pública brasileira continua, com argumentos a favor e contra o uso das GLOs. Enquanto alguns defendem sua necessidade em crises pontuais, outros alertam para os riscos e os custos associados.