“A partir de dois casos específicos, a Suprema Corte Americana em decisão redigida pela juíza Amy Coney Barrett, entendeu unanimemente que os funcionários públicos podem ser processados por bloquear usuários comuns ou deletar seus comentários, se a postura desses servidores nas redes for entendida como uma “ação de Estado“
Foi publicada na Revista Sociedade Militar uma cartilha eletrônica do Exército Brasileiro a respeito de segurança da informação. O documento tem o título “Política de moderação nas mídias sociais do Sistema de Comunicação Social do Exército Brasileiro“.
Se o visitante do site do Exército não se animar a ler do que se trata, vai, pelo menos, saber que a Força terrestre agora é dada a fazer “política” e a “moderar” alguém ou alguma coisa.
Caso se atreva a ler o aviso – pois se trata de um aviso, e, como se diz, “quem avisa amigo é” – o usuário vai descobrir que o Sistema de Comunicação Social do Exército brasileiro invocou um salvo-conduto para bloquear a torto e a direito qualquer cidadão, sem precisar de justificativa muito palpável.
A nota sobre as condutas passíveis de bloqueio pode ser conferida clicando neste link. Contudo, a bem da objetividade, vamos nos ater a alguns pontos notáveis:
O cidadão que incorrer em qualquer uma das condutas abaixo poderão ser bloqueados pelo Exército brasileiro nas redes sociais:
- Usar linguagem inapropriada, obscena, caluniosa, grosseira, abusiva, difamatória, ofensiva ou de qualquer outra forma reprovável;
- Fazer ameaças, assédio, injúria, calúnia ou difamação, ou qualquer outra forma de ilícito penal;
- [Mensagens que] Sejam ininteligíveis ou descontextualizadas;
- [Mensagens que] Contenham propagandas político-partidárias;
- Manifestações ou opiniões de cunho político ou ideológico.
“BLOCK” SEM RECURSO…
A questão não é se o EB está certo ou errado ao adotar essa “política” de “moderação” das opiniões emitidas pelos brasileiros.
A questão central dessa cartilha é a facilitação do bloqueio sem direito a contraditório (não é mencionado na cartilha, se há possibilidade de recursos ao Centro de Comunicação).
Para as condutas que tipifiquem calúnia, injúria e difamação já existem os artigos 138, 140 e 139 respectivamente. Basta que se configure a materialidade do ato.
Segundo informações disponíveis em sites do poder judiciário, a vítima (neste caso, o Exército brasileiro) pode realizar a notícia do crime comparecendo a uma delegacia próxima para registro da ocorrência ou procurar um advogado que ajuíze uma ação de natureza criminal.
A queixa apresentada será avaliada por um juiz, o qual observará os aspectos processuais, que após ser admitida a queixa, o autor do crime será notificado para, querendo, apresentar defesa.
Já o bloqueio de um usuário de redes sociais nos dias atuais, em que informações cada vez mais cruciais são veiculadas via internet, para além dos motivos que o suscitaram, pode incorrer em obstrução do acesso constitucional à informação.
O cidadão bloqueado numa rede social do Governo – que tem a obrigação constitucional de informar indiscriminadamente a todos os seus súditos – será justamente alvo de discriminação, punido enquanto durar o bloqueio, que pode ser eterno…
O QUE É BOM PARA OS EUA…
Se no Brasil, o “block” por parte de um órgão militar precisa só de uma cartilha de uma página para deixar um cidadão alijado de seu direito à informação, nos EUA a questão é bem menos simples.
A partir de dois casos específicos, a Suprema Corte Americana em decisão redigida pela juíza Amy Coney Barrett, entendeu unanimemente que os funcionários públicos podem ser processados por bloquear usuários comuns ou deletar seus comentários, se a postura desses servidores nas redes for entendida como uma “ação de Estado“.
Em outras palavras, quando o funcionário em questão “possui autoridade de fato para falar em nome do Estado” e “pretende exercer essa autoridade” por meio das mídias sociais – por exemplo, se faz pronunciamentos oficiais nas redes – ele pode ser processado por violar a Primeira Emenda da Constituição americana, que protege a liberdade de expressão do cidadão.
Já o Centro de Comunicação Social do Exército Brasileiro poderá, a partir de agora, cercear o direito à informação de qualquer cidadão que faça uso, por exemplo, de linguagem “inapropriada” ou “de qualquer outra forma reprovável”.