A nova sede do Banco Central no Rio de Janeiro, que deveria simbolizar modernização e eficiência, tornou-se um exemplo emblemático de desperdício e impasse burocrático. Após consumir R$ 87,5 milhões e permanecer inacabada desde 2019, a estrutura pode agora ganhar um novo propósito sob o comando da Marinha do Brasil. A possível transferência do prédio para as forças militares não apenas promete dar um destino estratégico à obra paralisada, mas também pode gerar impactos econômicos e logísticos significativos para a zona portuária.
Entenda os motivos por trás da interrupção, os desafios enfrentados e como a Marinha pretende transformar esse espaço em um polo militar e administrativo essencial para suas operações.
Marinha do Brasil pode assumir construção inacabada do Banco Central no Rio de Janeiro. Obra paralisada desde 2019 consumiu R$ 87 milhões dos cofres brasileiro
O Banco Central (BC) está em negociação com a Marinha do Brasil para a transferência da estrutura inacabada de sua nova sede, localizada na zona portuária do Rio de Janeiro. A construção, iniciada em 2010, deveria ter sido concluída até 2013, mas foi interrompida em 2019, após consumir R$ 87,5 milhões. Agora, a Marinha pretende utilizar o local para abrigar diversas unidades militares e otimizar seus serviços na região.
O impasse em torno da obra se arrasta há anos devido a problemas como achados arqueológicos durante as escavações, dificuldades na obtenção de licenças e a recuperação judicial da construtora responsável. Diante disso, o BC suspendeu os investimentos e, em 2022, retirou definitivamente o projeto do orçamento federal.
Com a possibilidade de transferência, a Marinha iniciou um processo licitatório para desenvolver o projeto básico de finalização do prédio. A ideia é aproveitar a estrutura para instalar organizações militares voltadas ao atendimento do público, ampliando sua presença na cidade e garantindo eficiência operacional. A formalização da cessão ainda aguarda parecer da Superintendência do Patrimônio da União.
Banco Central continuará utilizando parte da estrutura
Apesar das negociações para que a Marinha assuma a construção, o Banco Central pretende manter a ocupação de parte do edifício. O objetivo é transferir para o novo espaço o Departamento de Meio Circulante (Mecir), responsável pelo recebimento e distribuição das cédulas e moedas emitidas pela Casa da Moeda.
Desde a década de 1970, o BC busca alternativas para realocar o Mecir, atualmente instalado em um prédio tombado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), na avenida Rio Branco. A preservação do edifício impede a modernização da estrutura e dificulta a construção de casas-fortes para armazenar valores, além de restringir a operação da área de destruição de cédulas desgastadas.
Outro fator determinante para a mudança é o impacto que o transporte de dinheiro causa no trânsito da região central do Rio. A escolha da zona portuária para a nova instalação considerou a infraestrutura do local, que dispõe de vias mais largas e melhor logística para movimentação de valores em grande escala.
Mudanças no projeto e falta de verbas e superfaturamento resultaram na paralisação da construção
A construção da nova sede do Banco Central foi inicialmente concebida como um dos projetos estratégicos da revitalização da zona portuária. No entanto, o terreno escolhido estava situado em uma área de preservação histórico-ambiental, o que impunha restrições à altura dos edifícios, limitando-os a três andares.
Para viabilizar o projeto, a legislação urbanística foi alterada, permitindo a ampliação da estrutura para sete pavimentos. O BC contratou a construtora Engefort para executar as obras, prevendo uma expansão do contrato assim que as novas diretrizes fossem aprovadas. Com a liberação em 2012, a empreiteira iniciou a construção completa, mas os recursos disponíveis só foram suficientes para erguer a estrutura de concreto armado e parte dos acabamentos.
Uma auditoria realizada pelo Tribunal de Contas da União (TCU) no mesmo ano identificou um possível sobrepreço de R$ 23 milhões na licitação da obra. Alguns servidores chegaram a ser penalizados, mas posteriormente a punição foi anulada, pois o órgão concluiu que os responsáveis não tinham função direta na fiscalização do contrato.
O Ministério Público Federal (MPF) também analisou o caso, mas arquivou a investigação depois que o Banco Central justificou que a interrupção ocorreu exclusivamente por falta de verbas. Em nota, o BC esclareceu que não houve previsão orçamentária para dar continuidade à obra em 2020 e que, em 2022, optou por buscar novos destinos para a estrutura.
Marinha do Brasil prevê economia e impacto positivo para o Rio de Janeiro
Caso a transferência do prédio seja formalizada, a Marinha pretende utilizar a estrutura para concentrar várias de suas unidades, hoje dispersas em diferentes pontos do Rio de Janeiro. A proposta visa reduzir custos operacionais e otimizar o funcionamento dos serviços militares.
Dentre as instalações previstas para o local, destacam-se:
- Diretoria de Portos e Costas (DPC)
- Caixa de Construções de Casas para o Pessoal da Marinha (CCCPM)
- Centro de Comunicação Social da Marinha no Rio de Janeiro (CCSM-Rio)
- Serviço de Veteranos e Pensionistas da Marinha (SVPM)
- Instituto Naval de Pós-Graduação (INPG)
- Procuradoria Especial da Marinha (PEM)
- Biblioteca da Marinha
- Departamento de Veteranos do Comando do Pessoal de Fuzileiros Navais (CPesFN-70)
Com a centralização dessas unidades, a Marinha do Brasil espera diminuir os gastos com aluguéis, manutenção e serviços administrativos, além de melhorar a integração entre os setores. Em comunicado, a instituição destacou que a reestruturação possibilitará um aproveitamento mais eficiente da força de trabalho.
Além das vantagens logísticas e financeiras, a presença da Marinha na zona portuária tem potencial para impulsionar a economia local. A estimativa é que aproximadamente 1.090 militares e cerca de 1.000 visitantes circulem diariamente pelo complexo, gerando maior movimentação comercial e beneficiando o desenvolvimento da região.
A decisão final sobre a destinação do imóvel ainda depende da avaliação dos órgãos responsáveis. No entanto, a possível reutilização da estrutura por forças militares representa uma alternativa estratégica para evitar que o investimento já realizado se torne um prejuízo definitivo para os cofres públicos.