
Um post publicado há cerca de um ano no Reddit voltou a circular nas redes de concurseiros em 2025. Nele, um aluno do período básico da Escola de Sargentos das Armas (ESA) escreve, em letras maiúsculas de frustração: “Sou militar e não aguento mais”. O jovem de 24 anos, há apenas três meses no curso, conta que não se identifica com a rotina castrense, teme reprovar na corrida e cogita largar tudo para seguir carreira em programação.
O texto, simples e sincero, recebeu centenas de respostas de veteranos, civis e colegas que encaram os mesmos dilemas. Nos comentários, surgem queixas sobre soldos defasados, assistência médica precária e dúvidas quanto ao futuro profissional. O que parecia um drama individual logo ganhou dimensão coletiva.
A permanência do tema nos fóruns, um ano depois, mostra que a insatisfação não arrefeceu. Dados recentes da Sociedade Militar sobre salários, reajustes e estrutura de saúde mostram possíveis motivos que fazem muitos jovens fardados sonharem com concursos civis ou empregos na iniciativa privada.
O desabafo que incendiou o Reddit
O autor explica que entrou na ESA em sua última tentativa, após três anos de estudo. Apesar de elogiado pelos instrutores e disciplinado nas atividades diárias, admite “zero identificação” com a vida militar. A maior angústia é a parte física: ele corre mal e teme ser desligado por baixo desempenho atlético.
Nos comentários, formandos e sargentos confirmam que o curso básico é o período mais duro e sugerem “segurar firme”, conquistar a graduação e só depois decidir se vale a pena pedir baixa. Outros, porém, relatam ter deixado escolas militares e hoje trabalham como desenvolvedores de software, ganhando mais do que durante a formação.
Usuários lembram que desistir antes do final implica devolver despesas de instrução. Há quem veja nisso um freio, mas também quem argumente que “perder dinheiro é melhor que perder anos de vida infeliz”. O debate fica acalorado: alguns chamam o jovem de “covarde” por cogitar sair, outros defendem que militarismo exige vocação real e que forçar permanência gera profissionais frustrados.
Ao final, o post revelou um padrão: muitos recrutas chegam motivados pelo status de concurso público, mas descobrem rápido que rotina, ordenado e perspectivas de crescimento podem não compensar o sacrifício pessoal.
A matemática da regressão salarial desde 1989
Levantamento da Sociedade Militar mostra que o soldo, corrigido pelo IPCA, perdeu cerca de 70% do poder de compra de 1989 a 2025. A maior erosão ocorreu na década de 1990 e voltou a acelerar a partir de 2015, quando reajustes ficaram abaixo da inflação acumulada.
Comparações com carreiras civis federais agravam a impressão de defasagem.
Benefícios específicos, como adicional de habilitação, ficaram atrelados ao soldo depreciado, perdendo efeito compensatório. Nas redes sociais, praças revelam que precisam de plantões extras, bicos de segurança ou empréstimos consignados para fechar o mês.
Esse quadro repercute na reputação da carreira: novos alunos, como o autor do desabafo, chegam informados e desmotivados ao perceber que a estabilidade não garante poder aquisitivo.
A relação custo-benefício afeta até a alta patente. Oficiais admitem que, sem melhoria concreta, será difícil reter talentos técnicos que as Forças precisam, por exemplo, em tecnologia da informação e engenharia.
Assim, a matemática fria do salário se transforma em gatilho emocional para dúvidas vocacionais, como demonstra o post que reacendeu o debate um ano depois.
Reajuste 2025: pequena correção, grande frustração
A tabela de reajuste enviada ao Congresso concede 4,5 % para este ano e 4,5% para o outro. A inflação estimada já ultrapassa 4%, o que significa, na prática, ganho zero. Em grupos de WhatsApp, militares brincam que o aumento mal paga “um quilo de carne por mês”.
A insatisfação cresce porque o subsídio não é o único item congelado. Diárias de missão, auxílio-moradia e indenizações de fronteira estão defasados, pressionando quem serve longe dos grandes centros.
Praças argumentam que carreiras policiais estaduais receberam aumentos maiores, tornando-se alternativa atraente para soldados que cogitam migrar via novos concursos. Oficiais, por sua vez, temem efeito-cascata na adesão a cursos operacionais, essenciais para manter a prontidão.
Especialistas em contas públicas lembram que o espaço fiscal é limitado, mas defendem mecanismos como bônus por especialização, parcerias educacionais e vouchers de saúde para o dependente, a fim de suavizar o choque entre expectativa e realidade.
Enquanto isso, o jovem da ESA vê o futuro financeiro nebuloso. A ideia de “garantir o meu” perde força quando os números mostram que o soldo de terceiro-sargento não acompanha o custo de vida nas capitais onde muitos serão lotados.
A saúde que adoece: hospitais militares na berlinda
Outra queixa frequente dos militares é a assistência médica. Reportagem da Sociedade Militar utilizou inteligência artificial para analisar avaliações on-line e apontou 85% de insatisfeitos com hospitais das Forças. Há relatos de filas para exames, falta de especialistas e equipamentos obsoletos.
Veteranos alertam que a cobertura, vista como benefício histórico, perdeu brilho. Muitos pagam plano particular, mesmo já descontando contribuição obrigatória. Esse gasto extra pesa no orçamento e amplifica o desejo de trocar a farda por carreiras que ofereçam melhor assistência corporativa.
Vida pós-quartel: habilidades que o mercado valoriza
Apesar do cenário, há saída para quem decide migrar. Este nosso artigo lista seis competências militares que fazem ex-militares brilharem em entrevistas: liderança sob pressão, gestão de riscos, disciplina, fluência em tecnologia embarcada, trabalho em equipe multicultural e ética em ambientes regulados.
Empresas de logística, óleo e gás e segurança corporativa buscam justamente perfis acostumados a planejamento minucioso e resposta rápida a crises, habilidades aprendidas no quartel.
Cursos de transição interna, ainda limitados, ensinam montagem de currículo, networking e simulações de entrevista. Ampliação desses programas reduziria o medo que impede muitos militares de arriscar nova carreira.
Proprietários de startups de TI relatam boa experiência com ex-sargentos que viram desenvolvedores, destacando pontualidade e foco em metas. A recomendação é investir em portfólio de projetos, certificações e inglês técnico antes de pedir baixa.