Alemanha reativa 5.780 bunkers e convoca cidadãos a estocar mantimentos: governo teme ataque russo
Bunkers da Guerra Fria voltam a ganhar vida: Alemanha corre para modernizar abrigos e prepara população para sobreviver até 10 dias sem água e luz em caso de ataque russo
Por muito tempo, imaginar um conflito armado em solo europeu parecia coisa de livros de história. Mas isso mudou. A Alemanha, com seus 84 milhões de habitantes, já iniciou uma corrida contra o tempo para modernizar sua rede de bunkers e proteger a população de um possível ataque russo. A ameaça já não é mais tratada como uma hipótese distante.
Segundo o jornal The Guardian, o país conta hoje com cerca de 5.780 bunkers, a maioria construídos durante a Segunda Guerra Mundial e, em menor escala, na Guerra Fria. Eles foram projetados para um propósito bem claro: servir de abrigo para milhares de pessoas em caso de bombardeios ou ataques.
Agora, a Alemanha decidiu que chegou o momento de reativar e adaptar essa infraestrutura para um novo cenário geopolítico.
Preparação em ritmo acelerado
O The Guardian revelou que, após anos de confiança em um continente pacífico, Berlim está mudando sua política de proteção civil. O temor de um conflito com a Rússia nos próximos quatro anos levou o governo a elaborar um plano emergencial que prevê a mobilização da infraestrutura urbana existente e a modernização dos sistemas de defesa civil.
Ralph Tiesler, diretor do Escritório Federal de Proteção Civil e Assistência a Catástrofes (BBK), alertou que o país não está preparado para enfrentar uma guerra em grande escala. Por isso, ele defende uma mobilização nacional urgente para adaptar túneis, estações de metrô, porões e estacionamentos em abrigos capazes de proteger pelo menos um milhão de pessoas.
A mensagem é clara: a era da retórica pacifista ficou para trás. A Alemanha precisa agir para garantir a segurança da população diante de uma Rússia cada vez mais imprevisível.
Infraestrutura obsoleta e urgência de modernização
Mas há um enorme desafio pela frente. O atual sistema de proteção civil alemão está longe do ideal. Dos cerca de 2.000 bunkers herdados da Guerra Fria, apenas 580 estão operacionais, capazes de abrigar um ínfimo 0,5% da população.
A comparação com a Finlândia é gritante: o país nórdico conta com 50 mil abrigos, cobrindo 85% de seus cidadãos.
Sabendo que construir novos bunkers seria caro e demorado, o plano da BBK é priorizar a adaptação de estruturas já existentes. Ao mesmo tempo, o governo quer modernizar os sistemas de alerta, reforçar a segurança cibernética e criar sinalização eficaz indicando locais seguros para se proteger em caso de ataque.
Os recentes bombardeios massivos em cidades ucranianas como Kharkiv, que resultaram em dezenas de mortos e feridos, serviram como um alerta brutal para toda a Europa.
Investimentos bilionários e debate político
Um dos obstáculos ao avanço desse plano é o financiamento. A CNN revelou que o dinheiro ainda não está garantido. Espera-se que os recursos venham da suspensão temporária do teto de dívida aprovado pelo Parlamento em março, permitindo gastos emergenciais em defesa e infraestrutura.
O orçamento deverá ser distribuído entre áreas estratégicas, como inteligência, defesa cibernética, infraestrutura crítica (pontes, estradas) e modernização militar.
Tiesler estima que serão necessários pelo menos 10 bilhões de euros até 2028 para cobrir as necessidades básicas de proteção civil. E o montante deve chegar a 30 bilhões de euros na próxima década.
A disputa por esses recursos já se tornou um tema central no debate político alemão.
Cidadãos convocados a se preparar
Mais do que reformas estruturais, Tiesler também apelou para a responsabilidade individual da população. Ele propôs a criação de um serviço de proteção civil — voluntário ou obrigatório — e recomendou que cada residência tenha mantimentos suficientes para sobreviver por pelo menos dez dias sem água ou eletricidade.
Esse tipo de orientação segue a tendência de uma “resiliência preventiva” já adotada por outros países europeus. A meta é preparar não só as cidades e a infraestrutura, mas também a própria sociedade alemã para um cenário que, até pouco tempo atrás, parecia improvável: um conflito armado em solo continental.
Nova era na defesa civil alemã
A Alemanha começa assim a despertar do seu longo “sono estratégico” do pós-guerra. As prioridades mudaram. Se a França se ocupa da “reorganização” da Renault, Berlim corre para reorganizar seus bunkers.
A nova política de proteção civil marca uma mudança de mentalidade: não se trata mais de esperar o melhor, mas de se preparar para o pior.