Internacional – Nas redes sociais de militares dos Estados Unidos, o assunto desse sábado foi o resultado de uma visita na primeira semana de maio à base aérea de Andersen, em Guam, onde secretário da Marinha dos Estados Unidos, John Phelan, se declarou “chocado e consternado” com o estado precário dos alojamentos destinados a militares de baixa patente.
As imagens divulgadas por veículos como o Project on Government Oversight (POGO) revelaram fios elétricos expostos, infiltrações, paredes com mofo camuflado por tinta e tubulações corroídas – uma realidade distante da dignidade que se esperaria das forças armadas mais bem financiadas do planeta.
A indignação do secretário não se limitou a palavras. Phelan, segundo informações do site POGO, deu ordem para evacuação imediata de 73 militares que estavam alojados no decadente prédio Palau Hall, liberando com antecedência um novo complexo residencial do Corpo de Fuzileiros Navais em Guam. A medida teve repercussão imediata: o vice-almirante Scott Gray, chefe do Comando de Instalações da Marinha, determinou uma inspeção em nível mundial de todos os alojamentos destinados a militares solteiros.

“Teste do Washington Post”: a nova régua para dignidade
Na comunicação interna obtida pelo POGO, o vice-almirante Gray exigiu que todos os comandantes avaliassem os alojamentos sob o que chamou de “teste do Washington Post”: “Se as fotos das instalações fossem publicadas amanhã em um jornal de grande circulação, você conseguiria justificar que seus marinheiros morassem lá?”
A indignação parece ser compreensível. As imagens associadas aos e-mails internos mostravam paredes descascadas, estruturas degradadas, presença de mofo e sistemas elétricos comprometidos. Gray classificou a situação como resultado de uma “falha de liderança em vários níveis de comando”.
Embora o prédio em questão esteja sob responsabilidade da Força Aérea — e não da Marinha —, a situação escancarou uma crise mais ampla nas forças armadas dos EUA: a negligência com as condições básicas de vida dos militares de baixa patente, em especial aqueles em missões solitárias, sem suas famílias.
Avaliação de que há vidas em risco e repetição de falhas
O caso em Guam não é isolado. Em 2022, uma sequência trágica de suicídios a bordo do porta-aviões USS George Washington também foi atribuída, em parte, às condições de habitação inadequadas. Essa reincidência de falhas reforça a urgência de medidas concretas e duradouras.
Em entrevista ao POGO, o próprio vice-almirante Gray reconheceu que cerca de 20% dos alojamentos da Marinha se encontram atualmente em condições ruins. Ele afirmou que seu compromisso é garantir que todos os espaços habitacionais estejam à altura da dignidade que os militares merecem. “Não vou descansar até que eu possa me orgulhar de cada um dos nossos alojamentos”, declarou.
Falta de recursos ou falta de prioridade?
Apesar do esforço retórico e da mobilização de comandos em todo o mundo, há um obstáculo estrutural relevante: o orçamento. A Força Aérea, por exemplo, acumula um déficit de manutenção de quase 50 bilhões de dólares. O próprio Gray reconheceu: “Não temos como manter a Marinha que nos pedem com os recursos atuais”.
Um projeto legislativo apelidado de “Big Beautiful Bill”, proposto pelo ex-presidente Donald Trump, foi aprovado na Câmara dos Representantes e prevê US$ 1 bilhão para melhorias em alojamentos nas quatro forças principais — Marinha, Exército, Força Aérea e Força Espacial. O Corpo de Fuzileiros Navais, por sua vez, contará com um orçamento separado de US$ 230 milhões. No entanto, especialistas apontam que o valor é insuficiente diante do tamanho do problema.
Rob Evans, criador do aplicativo Hots&Cots, que permite a militares avaliarem suas condições de alojamento, foi enfático: “Um bilhão para quatro forças é uma quantia irrisória. E ainda corremos o risco de ver parte desse orçamento ser realocado para operações de imigração na fronteira sul.”

E as consequências?
Diante da grande repercussão que há entre militares dos EUA, em fóruns de discussões frequentados por militares, surgem questionamentos sobre possíveis responsabilizações de oficiais de alta patente. Phelan afirmou que não espera que esse problema se repita sob sua liderança, e que haverá consequências caso se repita. Entretanto, a Força Aérea não indicou se houve ou haverá qualquer medida disciplinar contra seus próprios comandantes responsáveis pelos alojamentos em Guam.
Robson Augusto – Revista Sociedade Militar