Revista Sociedade Militar, todos os direitos reservados.

Documento mostra que Marinha do Brasil se negou a discutir a questão racial: despertaria “consciência racial, recalques e complexos”

por Sociedade Militar Publicado em 09/08/2023
Documento mostra que Marinha do Brasil se negou a discutir a questão racial: despertaria “consciência racial, recalques e complexos”

George Schuyler, jornalista negro norte-americano, fez uma viagem pela América Latina em 1948, a intenção era retratar a presença e as experiências dos negros nas forças armadas dos países latino-americanos, incluindo o Brasil.

Em Cuba, ainda antes da revolução, o jornalista se surpreendeu positivamente pelo fato de brancos terem que obedecer às ordens de superiores negros nos quartéis. Ele acompanhou de perto a rotina do general negro Gregory Guarejeta, mas não encontrou outros oficiais de alta patente de ascendência negra. Na Marinha cubana o intelectual constatou também que havia apenas um oficial negro e, na aeronáutica não existia nenhum. Schuyler constatou que em Cuba nos anos 40 as posições militares de prestígio na hierarquia militar eram normalmente ocupadas por uma espécie de “aristocracia” que tinha acesso facilitado pelas academias militares.

No Brasil o jornalista tentou, por meio de amigos em universidades, ser recebido em quartéis da Marinha do Brasil, a intenção era documentar por meio de fotografias “até que ponto os elementos raciais” estariam integrados. Entretanto,  mesmo 30 anos após a Revolta da Chibata, o Comandante do Corpo de Fuzileiros Navais a Marinha ainda era resistente a esse tipo de discussão. Silvio de Noronha, comandante da tropa de fuzileiros, se negou a permitir tal pesquisa.

O comandante acreditava que o preconceito racial se resolveria de forma espontânea e que a discussão do assunto poderia despertar a consciência racial, recalques e complexos. O almirante disse ainda que no Brasil o “problema racial” havia “caminhado para uma solução satisfatória” por não haver foco no mesmo. Para o oficial o espírito democrático e cristão  faria o intercâmbio racial sem preconceitos.

George Schuyler acabou atestando que, enquanto a palavra oficial das instituições militares dizia que havia perfeita integração, que as coisas estavam se resolvendo sozinhas e que existiam militares negros no topo da hierarquia, a verdade era outra. Em “off” militares negros denunciavam que ainda havia “o preconceito de cor” na armada, instituição que havia sido, há apenas algumas décadas, palco de uma das mais corajosas reações contra o racismo registradas na história mundial.

Robson Augusto – Revista Sociedade Militar

Dados:
— CAMARGO, Sylvio de. [Carta a Arthur Ramos informando que a autorização para que George Schuyler possa documentar a integração racial na Marinha e no Exército é dada pelo Ministro da Marinha.]. Rio de Janeiro, RJ: [s.n.], 14 jul. 1948. 2 p. Disponível em: http://objdigital.bn.br/objdigital2/acervo_digital/div_manuscritos/mss1512237/mss1512237.pdf. Acesso em: 9 Aug. 2023.
— https://www.scielo.br/j/topoi/a/3VFyCCTtT65JVtnhPGG8PHc/?lang=pt#

Sociedade Militar

Sociedade Militar

Editoria da Revista Sociedade Militar - Notícias militares, forças armadas, polícia militar e segurança pública em geral. Análises sobre geopolítica e política brasileira.