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Com tecnologia 100% nacional, Brasil acelera projeto de foguete e mira protagonismo na nova corrida espacial

O projeto nacional que marca a entrada do Brasil na era espacial avança com tecnologia de ponta, parcerias estratégicas e testes rigorosos, aproximando o país da independência para lançar satélites e missões científicas do próprio território.

por Alisson Ficher Publicado em 11/06/2025
Com tecnologia 100% nacional, Brasil acelera projeto de foguete e mira protagonismo na nova corrida espacial

No interior do Brasil, longe dos grandes centros e da agitação dos programas espaciais de países como Estados Unidos, China e Rússia, uma revolução silenciosa ganha corpo em meio à expertise técnica nacional e à colaboração entre governo e iniciativa privada.

O país está cada vez mais próximo de entrar definitivamente na era do acesso independente ao espaço, com um foguete inteiramente projetado, construído e testado no território nacional.

Essa conquista tem nome e sobrenome: Microlançador Brasileiro, ou simplesmente MLBR. O projeto, desenvolvido por empresas brasileiras em parceria com o governo federal, alcançou no fim de maio de 2025 um marco técnico fundamental, que confirma a viabilidade e a maturidade da iniciativa.

Segundo informações do portal ”Poder Aéreo”, nos dias 29 e 30 de maio de 2025, o MLBR passou com sucesso pela Critical Design Review (CDR), ou Revisão Crítica de Projeto, etapa obrigatória em programas espaciais que envolvem tecnologias de alta complexidade.

A aprovação da CDR representa a validação final do desenho de engenharia do foguete e dá sinal verde para a construção dos primeiros protótipos. A partir de agora, o projeto avança para a fase de fabricação e testes práticos, com vistas ao lançamento inaugural previsto para 2026.

O que é a CDR e por que ela importa

A Critical Design Review é um dos momentos mais exigentes na vida de qualquer projeto aeroespacial.

Inspirada em padrões internacionais, como os aplicados pela NASA e pela ESA, essa revisão avalia se o veículo projetado é seguro, funcional e aderente aos requisitos definidos no início do programa.

Segundo Ralph Corrêa, diretor da Cenic Engenharia, empresa líder do consórcio que desenvolve o MLBR, a conclusão da CDR atesta o comprometimento da equipe com a excelência técnica e marca a entrada do Brasil em um novo patamar da exploração espacial.

Com 12 metros de altura e 1,1 metro de diâmetro, o MLBR será capaz de transportar até 30 kg de carga útil para órbita baixa (LEO), a uma altitude de aproximadamente 300 a 600 km.

O foguete usará três motores de propelente sólido, tecnologia que oferece simplicidade operacional e segurança durante o voo.

Desde a etapa anterior, chamada de Preliminary Design Review (PDR), o projeto passou por aprimoramentos para melhorar sua estabilidade e controle em voo.

Houve também um pequeno aumento na massa total do veículo, permitindo o acréscimo de mais combustível e, por consequência, maior alcance e eficiência orbital.

Sistemas de alta tecnologia já prontos

Durante a CDR, diversos subsistemas do MLBR foram analisados, com destaque para aqueles que já apresentam maturidade próxima da versão final.

O sistema de telemetria e o sistema de navegação inercial (SNI) impressionaram os avaliadores por estarem prontos para o voo. O modelo de qualificação desses componentes já foi construído e submetido a testes laboratoriais rigorosos.

Entre os ensaios realizados, destacam-se os testes de vibração do SNI-GNSS, que simularam as intensas oscilações do lançamento, incluindo momentos críticos como a ignição, a aceleração máxima e a separação de estágios. Os dados utilizados nos testes vieram de missões reais, assegurando confiabilidade aos resultados.

Outro avanço relevante foi a validação da integração entre o sistema de navegação e o Computador de Missão (CDM), considerado o “cérebro” do foguete.

O CDM processa dados em tempo real, toma decisões automáticas e garante o controle e a segurança do voo durante toda a trajetória.

Com a aprovação da CDR, o MLBR consolida-se como o projeto mais promissor da nova geração da indústria aeroespacial brasileira.

O que vem pela frente

Com a fase de design encerrada, o próximo grande desafio será a Systems Qualification Review (SQR), prevista para 2026.

Nessa etapa, os principais sistemas do foguete serão submetidos a testes práticos em condições extremas.

Na área de propulsão, os famosos “tiros em banco” — testes estáticos dos motores — permitirão validar o empuxo, o comportamento térmico e a resistência estrutural das peças sob altas temperaturas e pressão.

Também estão previstos testes ambientais com a eletrônica embarcada, simulando variações severas de temperatura, vibração e choques mecânicos.

Os ensaios de Compatibilidade Eletromagnética (EMC) garantirão que todos os sistemas funcionem corretamente mesmo sob exposição a interferências eletromagnéticas e descargas.

Esses testes são fundamentais para evitar falhas em voo, garantir a confiabilidade dos dados transmitidos e proteger os componentes eletrônicos de danos provocados por fenômenos físicos durante o lançamento.

Por que isso é importante para o Brasil

O MLBR não é apenas um foguete.

Ele representa soberania, independência tecnológica e um passo estratégico para colocar o Brasil entre as nações com capacidade autônoma de acesso ao espaço.

Desenvolver veículos lançadores de forma local significa reduzir a dependência de plataformas estrangeiras e estimular uma cadeia de inovação altamente especializada.

O programa é financiado pelo Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), com apoio da Finep e da Agência Espacial Brasileira (AEB).

O projeto reúne um consórcio formado por empresas de base tecnológica nacionais como Cenic Engenharia, ETSYS, Concert Space, Delsis, Plasmahub e parceiras estratégicas como Bizu Space, Fibraforte, Almeida’s e Horuseye Tech.

A iniciativa também fortalece o ecossistema industrial brasileiro, promovendo a geração de empregos de alta qualificação e incentivando a formação de mão de obra especializada.

Além disso, o sucesso do MLBR pode abrir caminho para futuras missões científicas, lançamento de satélites meteorológicos, monitoramento ambiental, comunicação e até aplicações militares.

Alisson Ficher

Alisson Ficher