Segundo o professor de ciência política da Universidade de Brasília (UnB) Rodrigo Lentz, que estuda o pensamento político do militar brasileiro, além das responsabilidades individuais de militares que participaram dos atos golpistas do 8 de janeiro, as Forças Armadas, como um todo institucional, têm responsabilidade política em relação à invasão das sedes dos Três Poderes, em Brasília.
Em conversa com a Agência Brasil, órgão de imprensa do Governo, o professor disse que “o Exército tolerou e permitiu que esses indivíduos usassem a instituição para conspirar o golpe de Estado.
E essa responsabilidade política precisa ser cobrada a partir de reformas nas relações entre civis e militares e na criação de garantias de que isso não voltará a ocorrer”. Lentz, destaca que várias ações e omissões confirmam uma tolerância dos militares com o movimento golpista.
“Desde dar adesão mais ampla a um projeto político partidário, que foi o governo Bolsonaro, até a permissão de militares de alta patente da ativa ocuparem cargos de ministro de Estado.
Além disso, podemos falar da participação claudicante e de quase desestabilização do processo eleitoral a partir da atuação dos militares na comissão de fiscalização do TSE [Tribunal Superior Eleitoral], e também a posição em relação aos acampamentos”, enumerou.
A NOTA GOLPISTA
Lentz destacou a nota dos três comandantes das Forças Armadas – da Marinha, do Exército e da Aeronáutica – do dia 11 de novembro de 2022 intitulada “Às Instituições e ao Povo Brasileiro”. No texto, os comandantes condenaram “eventuais excessos” cometidos por manifestantes, mas sustentaram que os atos não constituíam qualquer crime.
“A nota dos comandantes, logo depois do final do resultado eleitoral, ao não reconhecer de forma aberta, clara e indubitável o resultado eleitoral, alimentou a sanha golpista. Ou seja, os comandantes da época alimentaram a sanha golpista, seja pelo discurso à nação a partir de uma nota oficial, seja a partir da permissão e de apoio aos acampamentos”, destacou o especialista.
“Quando um capitão e vários generais e oficiais defendem a ditadura de 64, negando as graves violações dos direitos humanos que ocorreram no período, e quando esses militares voltam ao poder, eles vão tentar naturalmente o golpe de Estado para se manter no poder.”
MUCIO, PAZ E AMOR
Na avaliação do ministro da Defesa, José Múcio, e do ministro interino da Justiça e Segurança Pública, Ricardo Cappelli, é preciso separar os indivíduos das instituições.
Em declarações à imprensa, Múcio defendeu que alguns militares cometeram irregularidades em relação ao 8 de janeiro, mas que a instituição não teria apoiado a aventura golpista.
Matéria publicada pela Revista Sociedade Militar mostra trechos da entrevista do Ministro da Defesa, em que ele, ao ser questionado sobre as eventuais responsabilidades dos militares no movimento de 8 de janeiro, diz que torce “muito para que as investigações encontrem os culpados.
Para as Forças Armadas, é fundamental, para que essa névoa de suspeição que paira sobre os militares se dissipe. Precisamos dos nomes, para puni-los.”