Podia parecer burlesco quando, Donald Trump, o presidente da maior potência nuclear do planeta decidiu há alguns meses que o Golfo do México fosse rebatizado para Golfo da América. Pareceu menos engraçado, mas ainda assim, digno de algum deboche, quando Trump disse que o canal do Panamá deveria retornar aos Estados Unidos, sob justificativa de que a China estava se beneficiando da estrutura. Só que a chacota acabaria – pelo menos do ponto de vista do Brasil – se Trump decidisse que uma determinada área bastante sensível do território brasileiro tem grandes chances de se tornar um protetorado americano. O problema é que essas “grandes chances” podem ser uma possibilidade real.
O argumento que foi usado nas declarações sobre o Canal do Panamá – de que “foram os Estados Unidos que construíram, pagaram e defenderam a instalação durante o século XX” – segundo setores trumpistas, justificaria a reivindicação do controle técnico-operacional da estrutura interoceânica localizada no país.
De acordo com uma notícia dada com exclusividade pelo site especializado Defesanet, algo parecido pode ocorrer em terras brasileiras.
A pressão dos EUA por acesso às bases militares no Brasil
“Diplomatas vinculados a setores republicanos dos Estados Unidos, diretamente associados ao núcleo político do presidente Donald Trump, vêm articulando informalmente com interlocutores brasileiros” – o Defesanet não identifica quem são esses interlocutores – “o uso irrestrito do Aeroporto de Fernando de Noronha (SBFN) e da Base Aérea de Natal (BANT), no Rio Grande do Norte.”
No caso do arquipélago de Fernando de Noronha, o argumento empregado remeteria ao conceito de direito histórico de retorno operacional, com base em investimentos realizados pelos Estados Unidos da América, durante a Segunda Guerra Mundial e o período da Guerra Fria.
No caso brasileiro, ainda conforme análise do site de notícias, trata-se de ativos geoestratégicos de alto valor: Fernando de Noronha como sensor-forward base no Atlântico Sul equatorial, e a Base Aérea de Natal como hub logístico de trânsito transcontinental, compatível com operações aéreas interteatrais, e também como base de prontidão para projeção sobre a África Ocidental e litoral norte sul-americano.
Histórico do uso americano em Fernando de Noronha e Natal
Durante a Segunda Guerra Mundial , o arquipélago de Fernando de Noronha foi cedido pelo Brasil aos Estados Unidos em 1942, como parte de um acordo mais amplo dentro do esforço conjunto contra as potências do Eixo.
Os Estados Unidos instalaram ali uma base aérea estratégica, usada para apoio logístico e vigilância marítima, dada sua localização central no Atlântico Sul.
Esse uso foi formalizado por meio de acordos bilaterais, especialmente o Acordo de Washington de 1942, que autorizava os EUA a usarem diversas bases brasileiras, incluindo Fernando de Noronha, Recife, Natal, Fortaleza e Belém.
Esses acordos foram renovados ao longo dos anos, particularmente durante a Guerra Fria, sob o pretexto da cooperação hemisférica e de segurança regional.
O conceito de direito histórico de retorno operacional
Embora o termo não esteja formalmente previsto em tratados internacionais públicos vigentes, ele costuma ser mencionado em análises geopolíticas e documentos militares como uma cláusula tácita ou um entendimento diplomático decorrente desse contexto histórico.
O “direito histórico de retorno operacional” pode ser interpretado como:
A permissão implícita ou reconhecida de que os EUA possam retomar o uso de certas instalações estratégicas no exterior, em situações de crise ou emergência nacional, com base em acordos anteriores ou precedentes históricos.
Acordos bilaterais e cooperação militar Brasil-EUA
No caso específico de Fernando de Noronha, alguns analistas sugerem que, embora a base tenha sido formalmente devolvida ao Brasil (oficialmente em 1962), os EUA mantiveram um direito informal ou tácito de acesso às instalações em determinadas circunstâncias, especialmente em contextos de ameaças globais ou regionais à segurança.
Essa ideia ganhou força de novo na década de 2000, quando houve debates sobre a possível modernização da infraestrutura da ilha e seu uso compartilhado por forças estrangeiras, particularmente no contexto de parcerias estratégicas com os Estados Unidos.
Além disso, acordos como o Acordo de Cooperação Militar Brasil-EUA (2022) reforçaram a colaboração bilateral, levantando discussões sobre os possíveis acessos futuros dos EUA à ilha.