Em tempos de guerra, estratégias militares inovadoras surgem constantemente, e a mais recente não envolve campos de batalha ou reuniões secretas de líderes mundiais.
A Rússia tem utilizado as redes sociais, principalmente o TikTok, para recrutar cidadãos de outras nações, atraindo-os para lutar contra a Ucrânia.
O uso de plataformas digitais para convencer estrangeiros a se alistarem no Exército russo é uma prática que tem ganhado notoriedade, e os relatos de cidadãos chineses capturados em Donetsk são apenas uma das evidências de como as redes sociais estão sendo exploradas com esse objetivo.
A guerra digital se tornou uma arma poderosa, e a Rússia, reconhecendo o potencial do TikTok e outras plataformas, vem criando campanhas de recrutamento disfarçadas de vídeos atraentes.
Esses vídeos, produzidos com alto apelo visual, buscam mostrar o combate na guerra como uma oportunidade promissora e acessível.
Não se trata apenas de propaganda, mas de uma verdadeira engenharia social para alcançar uma audiência global e convencer indivíduos, especialmente de países como a China, a se envolverem diretamente no conflito.
O recrutamento através das redes sociais: uma tática globalizada
Segundo matéria do portal ”R7”, embora a guerra na Ucrânia tenha levantado discussões sobre os métodos tradicionais de recrutamento, a Rússia se adaptou à era digital, utilizando as redes sociais para alcançar uma nova geração de soldados.
O TikTok, conhecido por seu formato rápido e visualmente envolvente, se tornou uma ferramenta chave para atrair jovens de diversas partes do mundo, oferecendo-lhes uma “promessa de prestígio e aventura”.
Esse tipo de recrutamento digital também pode ser visto como uma maneira de contornar as limitações impostas por embargos e restrições internacionais, permitindo que a Rússia busque novos combatentes sem precisar de acordos formais com outros governos.
O relato de dois cidadãos chineses: uma consequência do recrutamento digital
Os relatos de Wang Guangjun e Zhang Renbo, dois cidadãos chineses capturados pelas forças ucranianas em Donetsk, oferecem uma visão das consequências diretas desse recrutamento digital.
Eles afirmam que, após serem atraídos por vídeos de recrutamento no TikTok, decidiram se alistar no Exército russo, uma decisão que mudaria suas vidas de forma irreversível.
Guangjun e Renbo detalham como foram enganados pela propaganda visual dos vídeos, que mostravam o alistamento como uma chance de ganhar prestígio e uma vida melhor.
Eles relataram ter sido convencidos por um recrutador a viajar para a Rússia, onde, após um treinamento básico em Rostov-on-Don, foram enviados para a linha de frente na região de Donetsk.
Ambos destacam que, ao chegarem à Rússia, descobriram que as promessas feitas nos vídeos não correspondiam à realidade.
Os soldados chineses enfrentaram condições precárias, isolamento e um ambiente de guerra extremamente hostil.
Guangjun, por exemplo, revelou que foi tratado como uma peça descartável, sendo colocado em uma unidade com poucos compatriotas e em uma rotina repleta de incertezas.
Renbo, por sua vez, teve problemas com o pagamento prometido em dinheiro, com o valor destinado a cobrir suas despesas confiscado pelos soldados russos.
Os prisioneiros alertaram outros cidadãos chineses a não se “deixarem enganar por promessas de dinheiro fácil e prestígio”.
A atração digital: recrutamento 2.0
O caso de Wang Guangjun e Zhang Renbo é apenas uma das histórias que ilustram um fenômeno crescente: o recrutamento militar via plataformas digitais.
O TikTok tem sido a principal ferramenta de recrutamento usada pela Rússia devido ao seu alcance global e ao formato visualmente atrativo que conquista especialmente os mais jovens.
Esses vídeos, muitas vezes elaborados para parecerem campanhas publicitárias legítimas, não só promovem a ideia de um Exército forte e unido, mas também fazem o recrutamento parecer uma escolha acessível e vantajosa para quem busca uma oportunidade fora das fronteiras de seu país.
Ao contrário dos métodos convencionais de recrutamento, que exigem uma mobilização de tropas e uma logística mais complexa, o recrutamento digital é eficiente e praticamente ilimitado.
A Rússia agora pode recrutar pessoas de qualquer lugar do mundo, contornando a necessidade de acordos internacionais e, de certa forma, utilizando a guerra cibernética como uma extensão das suas ações militares.
Esses vídeos de recrutamento oferecem um “caminho fácil” para a guerra, mostrando de maneira distorcida como é simples se tornar parte da luta sem se preocupar com as consequências que podem surgir.
As implicações globais e diplomáticas
O uso de redes sociais como ferramenta de recrutamento tem consequências diplomáticas significativas, especialmente quando se trata de países como a China, que se vê em uma posição delicada devido ao envolvimento de seus cidadãos no Exército russo.
Pequim, até agora, não se pronunciou oficialmente sobre o recrutamento de seus cidadãos, apesar de já ter alertado os chineses a evitar áreas de conflito e destacado que lutar em exércitos estrangeiros é um crime sob a legislação do país.
No caso de Guangjun e Renbo, a Ucrânia usou a captura desses prisioneiros como evidência de como a Rússia tem aproveitado o ambiente digital para recrutar combatentes estrangeiros.
Isso não apenas coloca o governo chinês em uma posição complicada, mas também expõe um aspecto sombrio da guerra moderna: a guerra não é mais apenas travada nas frentes de batalha tradicionais, mas também nas plataformas digitais, onde as fronteiras nacionais são borradas e as campanhas de recrutamento podem atingir qualquer pessoa em qualquer lugar do mundo.